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Tecnologia – Todo excesso será punido pelo Sr. Mercado

Pela rapidez que trafegam as informações, sabemos quase em tempo real dos avanços decorrentes do uso da mais elevada tecnologia, sendo que, a maioria dessas tecnologias, originalmente, é aplicada com êxito comercial em culturas de países desenvolvidos. E, com o decorrer do tempo, principalmente pela sua natural acessibilidade, passam a estar disponíveis nos países em desenvolvimento, como é o caso do Brasil. Contudo, os benefícios comerciais das novas tecnologias em nossa sociedade dependem diretamente de estarmos vivendo um real crescimento econômico e social, pois, mesmo que essas sejam soluções mais acessíveis, elas demandam uma ótima infraestrutura tecnológica e que os usuários paguem pelo acesso a redes sem fio, além de terem que adquirir constantemente novos dispositivos para fazer um bom uso das novas soluções.

Uma pergunta direta: as cidades onde sua Singular compete possuem condições de terem um shopping center de bom porte com 100 lojas, sendo, no mínimo, cinco delas lojas âncoras como Lojas Americanas, Lojas Marisa, Casas Bahia…? Muito provavelmente a resposta será negativa, o que nos permite afirmar que as lojas tradicionais de rua se mantém firmes nestes mercados. Já em grandes centros temos gradualmente a migração para os shopping centers, mas isto nem de longe sinaliza o fim das tradicionais lojas de rua, as quais naturalmente se adaptam a estas mudanças, pois os públicos também se tornam distintos. Diante dessa constatação, pedimos atenção para verificar se, em um futuro próximo, as agências bancárias totalmente automatizadas localizadas em grandes centros (sem atendimento humano) podem, na próxima década, virem a ser um grande modelo de negócio. Porém, não acreditamos que este modelo automatizado possa com a mesma rapidez vir a ser também aplicado nas praças onde sua Singular atua, haja vista a especificidade de nosso modelo de negócio, onde o atendimento é ainda um dos seus fortes diferenciais.

Seus melhores clientes e sua cultura: Passemos a observar a percepção do que seja um atendimento bancário de qualidade frente aos serviços prestados por sua Singular aos seus maiores investidores e aqueles com elevados saldos em cota capital, como também aos seus executivos, seus sócios fundadores, os dirigentes da entidade mantenedora original que apoiou a formação da Singular, e os fortes formadores de opinião em cada uma das suas praças de atuação. Certamente eles podem até ser usuários de soluções tecnológicas de sua Singular, mas certamente desejam e merecem “colo”, reconhecimento e respeito diante da relevância e dependência que sua instituição tem frente a eles. Assim, apesar de estarmos antenados com o futuro, inclusive com acesso há vários periódicos e vídeos sobre o futuro das instituições financeiras diante da mudança mundial da sociedade e pelo uso da tecnologia, peço calma! Em nosso mercado, após 40 anos de vivência, não considero a inovação tecnológica como um decisivo diferencial competitivo, pois ela logo se estabiliza, barateia, fica mais segura, e, assim, acompanhamos com segurança a tecnologia, mas não se copia um bom atendimento para os nossos sócios. Este é um diferencial competitivo simples, óbvio e sustentável. “Para algumas coisas, não tem preço”, outra tem a tecnologia.

Tendências sócias econômicas: Há um cenário que nos remete a prever anos de fortes instabilidades econômicas e políticas, potencializados pela abrupta e real estagnação do crescimento da base da classe média, que vinha da ascensão de um grande número de pessoas oriundas do topo da classe baixa. Essas foram gradualmente promovidas pelas recentes duas décadas de estabilidade econômica e pela enorme facilidade ao crédito. Vale ressaltar que este enorme grupo da população terá grandes dificuldades para abrir mão das novas experiências, advindas do consumo de bens e serviços mais elaborados.

Já é fato que o desemprego cresce a passos largos, afetando sobremaneira os jovens até 25 anos. Contudo, sendo muito menor frente aos profissionais qualificados com mais de 40 anos. Isto é natural, haja vista que para qualquer empresário que acredita no futuro de seu negócio é prudente manter os capitães de sua frota mercante frente às intempéries climáticas, e demitir ajudantes menos qualificados, os quais podem ser facilmente repostos tão logo volte a calmaria. Diante deste cenário devemos nos perguntar, onde estrategicamente deve estar o foco de nossos executivos? Seria na busca da tecnologia para reduzir custos e prover ganhos de escala, mesmo que nas praças onde atuam ainda não desejem e/ou valorizem a elevada tecnologia, como se vê em grandes centros? Ou deveriam ter clareza e certeza que estão efetivamente entregando um ótimo atendimento para seus melhores associados, mesmo que alguns destes demandem elevado grau de soluções tecnológicas disponíveis na Singular?

Atendimento de qualidade para todos os sócios ou apenas aos bons clientes: os bancos de varejo massificado têm na tecnologia uma forte aliada, em especial quanto ao atendimento da grande massa de sua base de clientes, pois estes, com menor poder de compra, conseguem viabilizar ganhos através de seus autoatendimentos e do pagamento de altos juros de seus discretos limites pré-fixados. Esta realidade é facilmente encontrada em grandes centros, onde o tempo e a logística direcionam esta massa de clientes automaticamente para a mais rápida solução, e esta fortemente dependente de tecnologia, seja nos caixas automáticos, internet ou 0800. Individualmente estes clientes de menor potencial de geração de receita não têm condições de exigir ou custear atendimento pessoal, tradicional, com qualidade como os usualmente disponíveis em boas agências bancárias.

Fica, então, a grande interrogação. Nosso modelo de negócio é balizado pela igualdade dos sócios, e vê-se que os grandes bancos automatizam à revelia o atendimento dos clientes de baixo potencial de receita, visando viabilizar economicamente esse público. Seria correto, portanto, buscarmos a tecnologia para atendermos de forma automatizada (barata) nossos sócios menos rentáveis, dando a eles um atendimento apenas mediano, e focarmos nossos esforços para darmos ótimo atendimento a nossos mais preciosos clientes (também sócios)?

Parece-nos razoável que, diante de nossos sócios, ofertemos com qualidade o atendimento em nossas tradicionais agências, sempre observando que grandes investidores, tomadores e contas empresariais demandam e desejam mais atenção. Contudo, seria ingênuo acreditar que dentro de alguns anos não será obrigatório nossos executivos adotarem estratégias comerciais onde sócios de menor potencial de receita serão atendidos por canais 100% tecnológicos, visando ganhos e competitividade frente ao projeto de perpetuação da Singular. O outro grupo de clientes (mais rentáveis) decidirá o canal que deseja ser atendido: automatizado ou presencial.

Como alongar a política de aderência: vimos em vários de nossos artigos que onde há cifrão não há fidelização, e que devemos buscar o relacionamento comercial que rotulamos de uma paga justa por um tempo justo. Precisamos antes de tudo analisar a nossa real capacidade de prestar um bom atendimento a nossos sócios, permitindo que esse julgamento seja real e não empírico ou metido por pesquisas mercadológicas com vieses tendenciosos de origem. Por esses e por outros motivos pontuais percebemos que alguns de nossos executivos são tentados há rotular como muito bom o atendimento que presta aos seus sócios. E por atuar intensamente neste mercado sabemos que ainda temos muito terreno para chegarmos a este rótulo.

Assim sendo, na visão dos clientes, a figura do “meu” gerente (âncora de conta) e da “minha” agência (segurança institucional) que escolhi deve ser diuturnamente a eles revigorada, pois precisam em alguns momentos buscar este porto seguro físico para evoluir no relacionamento comercial. Esse é um diferencial comum em nossas Singulares e que deverá ainda sê-lo por um bom tempo. De forma global, na gestão do relacionamento comercial, a tecnologia tem elevado potencial para incrementar de forma substancial este convívio com os sócios, permitindo maior interação e aderência entre as partes, inclusive com seu gerente da conta.

Fala-se muito em clientes jovens como um ótimo nicho mercadológico. Peço que releiam atentamente o artigo postado em 17/01/2014 intitulado “Bons clientes – Jovens avulsos ou entidade família”, o qual está também na página 48 da 5ª edição de nossa Revista Visão Comercial do Cooperativismo de Crédito com 92 páginas (26 artigos) enviada a todos os executivos das nossas Singulares. De forma breve, temos que ter soluções tecnológicas para os filhos dos bons clientes, e não para qualquer filho de nossos clientes ou para jovens avulsos no mercado. Apesar da plástica da ação e da até aparente coerência deste esforço, vê-se na prática que é algo descompassado e um dispêndio desnecessário de nossas escassas energias. Diante do estressante mercado que atuamos e das intempéries econômicas que surfaremos é altamente temeroso focar de forma massificada nos jovens, unicamente porque são universitários ou apenas por serem grandes usuários da tecnologia.

Reflexões finais: devemos gerir nosso modelo de negócio buscando fortes diferenciais, que sejam dificilmente copiados pelos concorrentes, além de aproveitarmos ainda mais os exclusivos benefícios das Sobras, IOF, “ser dono”, singularidade, fomento a riqueza local, entre outros. É indubitável que a tecnologia veio para ficar e será cada vez mais um forte diferencial competitivo, na proporção direta do amadurecimento dos micromercados. Seu uso pasteurizado ou a exigência de termos em tempo real as mesmas tecnologias de nossos maiores concorrentes será um descompasso comercial, com consequências imprevisíveis ao nosso modelo de negócio, acarretando um distanciamento na qualidade do atendimento personalizado aos nossos sócios.

Proponho que nossas soluções tecnológicas, que já são eficazes na grande maioria de nosso modelo de negócio, estejam sempre em evolução, mas que não sejamos precipitados em torná-las o único canal de atendimento para uma grande casta de nossos sócios, tal qual hoje se vê em bancos de varejo massificados de primeira linha que atuam fortemente em grandes centros.

Assim, imagino o futuro saudável para o cooperativismo de crédito: um robusto trem Maria Fumaça. Sereno, simples, forte e constante em seu movimento até o seu destino, para o qual nossos sócios compraram passagem. Tecnologia deve ser nosso último vagão e estará à disposição na sua plenitude ou em alguns serviços específicos aos seus sócios, os quais estarão bem acomodados nos vagões tradicionais. Ao colocarmos a tecnologia em nosso primeiro vagão, tendemos a ter uma visão ofuscada do passado e uma amplitude teórica hiper otimista e de primeiro mundo sobre o futuro, esquecendo a singularidade que nos faz competir com diferenciais comerciais diante de grandes concorrentes que adotam soluções pasteurizadas e tecnológicas em todo nosso eclético país.

Prever o futuro frente aos avanços tecnológicos é razoavelmente fácil, mas manter-se vivo até lá precede de astúcia, simplicidade e foco no que hoje é valor para os melhores sócios de cada uma de nossas 1.200 Singulares, as quais competem em centenas de díspares micromercados.

Concordar é secundário. Refletir é urgente.

Ricardo Coelho – Consultoria e Treinamento com Foco no Cooperativismo de Crédito

www.ricardocoelhoconsult.com.br – 41-3569-0466 – Postado em 29/06/2015