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Singulares – Como se portar diante desta longa crise

Pular de paraquedas é um misto de crise projetada e emoção descontrolada, somado a uma pitada de irresponsabilidade. A sensação é indescritível, algo que o faz reviver o irreverente espírito de juventude quando, ao buscar limites foras do limite, tínhamos ainda mais certeza de que a vida só deve ser vivida como protagonistas. Há pouco tempo, tive uma ótima ideia ao resolver criar uma nova crise, para a qual não tinha experiência, mas sabia que iria ser protagonista. Busquei uma sensação nova, mas para ela ser completa tinha que convencer minha esposa e meus três filhos a também serem protagonistas.

Convenci-os e decidimos instalar uma crise passageira, para que, assim aprendêssemos a dar valor a coisas bem mais relevantes do que os pequenos problemas do cotidiano, que estava nos consumindo. Depois de dias de ansiedade nos preparando para o enorme desafio, partimos para ele. Qual o desafio? Pular com toda a família de paraquedas. Chegamos ao aeroporto, nos vestimos como as roupas de paraquedistas, entramos em um pequeno e barulhento avião, subimos a 3.300 metros, ficamos dependurados na porta do avião, que era sacolejado pelo forte vento diante de uma imagem do chão indescritível. Do nada, realmente, saímos voando por 30 segundos em queda livre a quase 200 km/h. Que eternidade! Então, a crise tão desejada se instalou verdadeiramente. Toda minha família estava voando sem asas, e apesar de ter certeza que a chance de dar tudo certo era de 99%, o 1% restante ganhou a cena, já que sobre este mísero 1% não havia nada que eu pudesse fazer. Ao abrir o paraquedas reduz-se a velocidade para confortáveis 60 km/h, quando pode-se, então, curtir a paisagem por alguns minutos, enquanto o chão se avizinha esperando-nos para o tranquilo pouso. Ao final, ao nos abraçarmos após esta façanha histórica, chega ao fim esta crise estrategicamente instalada. A partir daí, dá-se, então, lugar para ótimas sensações, choros e risos diante de tanta emoção e crescimento pessoal, as quais são rememoradas em vídeos, porta-retratos e proteção de tela de nossos dispositivos tecnológicos. Pular sozinho de paraquedas é uma loucura, com toda a família foi um sonho.

Esta ação familiar é fruto do aprendizado da leitura sobre os preceitos que norteiam as culturas orientais, os quais dizem que se não há crise, o corpo padece e as pragas se instalam. Como é sábia a natureza, que permite que a concha crie pérola para se proteger de um intruso grão de areia!  Assim sendo, devemos sempre ter uma crise nos açoitando. Se não há temos, devemos criá-la, em especial para lapidar pessoas que amamos ou fortalecer os grandes projetos que lideramos.

A crise instalada por fortes organismos: mas o que podemos aprender dessa introdução sobre tipos de crises, diante da crise socioeconômica que nos é imposta pelo cenário macro nacional e internacional? Resumidamente ela mantém a mesma lógica, contudo, é de maior magnitude, pois foi instalada pelo descompasso de fortes organismos externos, sobre os quais pouco podemos interagir. Isto nos obriga a adotar medidas prudenciais nem sempre agradáveis, que nos permitem manter competitiva nossa posição comercial. Algo que será um enorme diferencial quando surgir o novo ciclo de bonança, e, assim, nele identificarmos a extinção ou falência de muitos de nossos concorrentes. Portanto, este artigo visa a compartilhar atitudes necessárias para que sejamos minimamente afetados por esta crise que teima em se agigantar.

Contextualização do Cenário da Crise: neste momento econômico complexo penso que há duas reflexões que todos nós cooperativistas de crédito deveríamos fazer:

A primeira reflexão

É a lógica comercial de que, se o cenário socioeconômico tornar-se mais estressante, para sobreviver não bastará ser forte, ágil e atualizado, haja vista que a competitividade estará a favor daqueles que não desdenham os sutis e perenes preceitos que norteiam as decisões comerciais do nosso eclético povo brasileiro. Algo tão bem edificado nas pessoas de Silvio Santos (SBT) e Samuel Klein (Casas Bahia), as quais sempre referendo por serem para mim grandes atores de nosso comercio varejista. Eles são testemunhos vivo e prático de que, com ou sem crise, há como superar a si mesmo, estruturando as obviedades comerciais para que possam se perpetuar neste complexo e arriscado mercado. Vale frisar que não estão esmiuçados em livros os sutis e quase perenes preceitos comerciais de nossa heterogênea população rentável, como é na população da região onde compete. Portanto, caberá aos nossos executivos garimpar e lapidar com muito mais profundidade estes perenes preceitos de sua região, já que há sinais discretos de que este entendimento se perdeu frente aos históricos bons resultados e a evolução exagerada do uso do academicismo, estes patrocinados por 20 anos de bonança, onde até os medianos cresceram.

A segunda reflexão

É a de que novamente estamos diante do início de uma forte crise comercial. E como é comum sempre nas crises, esta também nos deu sinais explícitos de que iria iniciar, entretanto, não fará nenhum esforço para sinalizar seu fim. Acredito que esta crise irá perder força apenas após 2018 (ano de eleição presidencial), seguida de mais três anos de penosa estagnação, acabando este triste ciclo em 2021. Isto, pois, toda crise tem um efeito devastador sobre os capitais produtivos e os meios de produção, e estes precisam de muito oxigênio para que respirem e voltem a confiar na economia e, assim, gerar emprego e renda. Em vista disso, após 2021, inicia-se lentamente e naturalmente um novo ciclo de pujança, o qual será fortalecido principalmente pela volta do consumo interno de bens e serviços retraídos por seis anos de estresse socioeconômico.

Obs: as estimativas do período acima levam em conta a manutenção do atual presidente da república até o final do mandado em 2018. Caso haja sua saída antecipada, sem nova eleição, imaginamos que será fraco seu efeito prático, impactando lentamente nos meios de produção, algo como reduzindo em um ano o período de estagnação de três para dois anos. Já havendo uma nova eleição para presidente dentro de 12 meses, haveria também impactos quanto aos resultados das eleições minoritárias de 2016, tendendo a um governo mais conservador e de direita. Isso agrada aos investidores, detentores dos meios de produção, fazendo com que a crise fique mais curta em um ano, e também reduz em um ano o período natural de sua estagnação, onde verificaremos uma mais robusta e rápida retomada da economia.

 Análise complementar da crise:

  1. Recentemente escutei um comentário de que esta crise é parecida com a de 2008, a qual nasceu nos Estados Unidos e impactou o mundo, fazendo com que nossos bancos recuassem e as Singulares avançassem de forma saudável. Temo esta comparação. Agora temos uma crise interna, onde o Brasil é o criador e a criatura, e o mundo continua sua natural oscilação.
  2. Havendo eleição em 2018, sem que haja troca radical da Presidência da República até lá, a população dará um grande crédito aos políticos eleitos para que resolvam os problemas econômicos e políticos com propostas coerentes e éticas para os problemas nacionais.
  3. Observo que o nosso modelo de negócio, diferente do vivido nas últimas duas décadas de bonança e de legislações favoráveis, pode, em breve, ser impactado pela agressividade do governo federal, o qual busca de forma desenfreada novas fontes de receitas para suprir a evolução desastrosa dos seus ineficazes gastos de custeio.

Como se portar diante desta longa crise: penso que para muitas de nossas instituições, continuar avançando em um ritmo agressivo irá expor muito mais a perenidade da instituição do que promovê-la. Estamos em uma maratona, e em algum momento devemos ficar mais seremos para que, descansados, possamos aproveitar o máximo da sinergia dos ventos a favor e as boas ladeiras. Vejo com preocupação a manutenção de agressividades comerciais desnecessárias em tempos de crise. Aconselho relerem o livro: A Arte da Guerra, onde se relata que há necessidade de várias táticas de guerra distintas para terrenos distintos. A praça de guerra mudou e irá mudar muito mais.

Fim de erros primários de curto prazo: muitas Singulares demonstram serem mais ágeis que nossos concorrentes. Apenas temo que algumas delas estejam demasiadamente impulsivas, querendo ser reconhecidas como grande em um momento em que este não é necessariamente um diferencial a ser alardeado. Prudência poderia ser algo a ser pensado, pois rever e/ou recuar estratégias deve fazer parte do cotidiano de qualquer empresa que pretenda se perpetuar. Sempre observando que, muito provavelmente, muitas Singulares ainda necessitam de um grande esforço comercial para atender eficazmente a sua base de associados. Essa ação demandará um enorme esforço e vários anos para saturar saudavelmente seus atuais clientes. A história está repleta de fatos que atestam ser equivocado despender muitos esforços para o crescimento vegetativo ou desenvolver complexos controles ou adotar teorias acadêmicas da moda, se a base ainda está longe se sua saturação saudável.

Resumidamente, acredito que uma grande parcela de nossas Singulares têm muitos clientes descolados de nossas verdadeiras soluções aderentes, pois tendem equivocadamente considerar quase tudo no computo da aderência. Vale ressaltar que ainda percebo que muitos clientes apresentem resultados significativos, mas que estes são obtidos quando nos usam como se fossemos apenas uma Financeira para superar períodos de estresse.

Na crise busquemos a eficiência e não permitamos erros primários de curto prazo (24 meses), pois o médio e o longo prazo estão carregados de incógnitas. A redução drástica de nossos erros primários de curto prazo é que fará o Sr. Mercado nos aceitar no jogo no segundo tempo (médio prazo). Peço atenção ao guiar doravante sua instituição baseando-se na evolução de números, como era confortável fazer nestes 20 anos de bonança, período este que faz parte da história.

Diante desse novo cenário comercial mais estressante, aconselho que nos esqueçamos dos nossos históricos e pujantes números e passemos com toda a intensidade a corrigir nossos erros comerciais primários de curto prazo, com destaque a aqueles afins a nosso posicionamento, precificação e custos correlacionados. E também passemos a ter cautela em nossa natural tendência de sempre nos darmos boas auto avaliações como gestores, ao nos basearmos apenas em números.

Reflexão final: a crise ora iniciada será longa, por isso devemos lembrar que nosso modelo de negócio não tem experiência nesta árdua caminhada frente à uma crise desta magnitude. Lembremo-nos, como já destacado acima, que a história está repleta de fatos que explicitam que, diante de épocas de estresses socioeconômicos ou naturais, os fracos sucumbem, os medianos tendem a se agigantar, e os grandes se enfraquecem por serem lentos e complexos, tal qual foi o pujante Titanic, teoricamente perfeito.

Em todo período de crise é necessário desapegarmos de investimentos, estruturas, processos e ações que pouco ou nada irão nos ajudar a sobreviver a crise ou fazer com que saiamos dela mais fortes. Na crise não há espaço para a teoria. Então, que, junto com os mais seniores, busquemos estratégias simples, ágeis e ajustadas às especificidades do nosso modelo de negócio, evitando, assim, que precisemos achar culpados muito próximos de nós!

Crie também pra você uma crise desafiadora. Pule de paraquedas. Mande-me fotos!

Concordar é secundário. Refletir é urgente.

Ricardo Coelho – Consultoria e Treinamento com Foco no Cooperativismo de Crédito
www.ricardocoelhoconsult.com.br – 41-3569-0466 – Postado em 02/10/2015