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Reservas não existem antes do débito dos Juros ao Capital

Por viajar muito sou grande usuário de GPS, WazeGoogle Maps e afins, porém sempre que me desloco entre cidades fico na dúvida sobre qual deles estará mais ajustado ao trajeto, pois eles sempre apresentam uma diferença em alguns quilômetros. E assim, pela prática, percebo que um deles usa como ponto de referência o “marco zero” da cidade, que tende a ser sempre uma praça ou uma grande igreja. Já outros se limitam a medir até o final da estrada que dá acesso a cidade destino, ou ainda a distância da divisa da cidade. Portanto, todos esses serviços nos levam ao local, mas com diferentes informações, o que é sem dúvida algo aceitável, pelo custo e liberdade que cada um desses aplicativos tem para se balizar.

Entretanto sabemos que a regulamentação é clara quanto à forma de uma Singular destinar no final do ano parte de seus resultados às suas Reservas. E este percentual é, no mínimo, aquele definido estatutariamente, o que significa dizer que não há duas métricas para informar ao órgão regulador e a seus associados qual é o percentual que foi somado a Reserva no último dia útil do ano anterior.

A lógica para este depósito em Reserva é que, depois de encerrado o ano civil anterior, onde já está incluído o impacto das despesas com juros ao Capital, deve-se aplicar o percentual estatutário para Reservas, ou respeitar o estatuto quando este define este numeral como sendo o “mínimo”. Portanto, neste caso, caberia ao Conselho, com apoio do executivo, direcionar em “30/12/20XX” um percentual acima da base mínima estatutariamente definida. Contudo, na AGO, os líderes da Singular estão livres para direcionar para a Reserva parte das Sobras a disposição da Assembleia.

Ocorre que vemos em algumas Singulares o cálculo da Reserva anual usar o percentual aplicado sobre o resultado do ano anterior, sem que tenham sido descontados os juros ao Capital, gerando um percentual distorcido e não coerente com a legislação e com as diretrizes traçadas pelo estatuto.

Vejamos este rápido exemplo caso a Singular remunere seu Capital Social: uma Singular estatutariamente direciona para a Reserva 30% de seu resultado. Imaginando que esse resultado foi de R$ 12.000.000,00, sem que dele se tenha descontado os R$ 4.000.000,00 pagos como juros ao Capital. Se usarmos erroneamente o cálculo de 30% sobre R$ 12.000.000,00, teremos destinados à Reserva R$ 3.600.000,00 (30% do resultado). Mas, se aplicarmos a legislação que prevê que antes de calcularmos a Reserva, devemos retirar do resultado os Juros ao Capital por ser uma despesa do ano corrente, teríamos 30% aplicado sobre R$ 8.000.000,00, o que resultaria em uma destinação à Reserva de R$ 2.400.000,00 e não R$ 4.000.000,00. Ou seja, R$ 1.200.000,00 a menos na Reserva.

Concordamos que caso o estatuto defina que, “no mínimo” 30% do resultado seja destinado à Reserva, o valor de R$ 3.600.000,00 estaria correto apenas quanto ao montante. Mas não estaria correto informar ao órgão regulador, associados e a sociedade que foi 30% para a Reserva, omitindo sua real grandeza de 45% do resultado. Pode parecer um pequeno equívoco, mas diante da complexidade que é a gestão de uma Singular, a existência de Governança em muitas delas e a necessidade de transparência nas decisões públicas de nosso modelo de negócio, seria oportuno que não tivéssemos nenhuma Singular com este descompasso.

Legislação 5.764/71 Capítulo VII – Dos Fundos – Art. 28. “As cooperativas são obrigadas a constituir: I – Fundo de Reserva destinado a reparar perdas e atender ao desenvolvimento de suas atividades, constituído com 10% (dez por cento), pelo menos, das sobras líquidas do exercício”.

Reflexão Final: em muitos casos a legislação que trata do mercado financeiro e do cooperativismo de crédito permite duplas interpretações, mas quanto à forma do cálculo de destinação à Reserva não nos parece que há na legislação vigente formas de interpretá-la como se pudéssemos admitir uma leitura mais complacente. A qual permite destinar mais recursos para a Reserva do que o estatutariamente definido ou acima do percentual aprovado pelos líderes, simplesmente considerando que o estatuto permite tal prerrogativa por constar nele a expressão “no mínimo” x% do resultado para as Reservas.

Eventualmente, pode haver alguma de nossas mais de mil Singulares adotando o percentual destinado as Reservas com base nas Sobras líquidas do Exercício, sem deste montante retirar os Juros pagos ao Capital. Portanto, caso haja, é oportuno rever esta prática, pois para este tema só há uma forma de mensurar esta destinação para Reservas, diferente do GPS, WazeGoogle Maps

Concordar é secundário. Refletir é urgente.

Ricardo Coelho – Consultoria e Treinamento com Foco no Cooperativismo de Crédito
www.ricardocoelhoconsult.com.br – 41-3569-0466 – Postado em  31/10/2016