É gratificante quando temos em nossas vidas pessoas que graciosamente nos ensinam coisas relevantes e que internalizamos para uso em nosso cotidiano. Lembro que uma tia, ao me explicar uma compra de um bem de valor que há muito desejava e para a qual havia feito muito estudo e pesquisa, me disse simplesmente: “se é bom, é caro uma vez só”. Na época não entendi a grandeza desse significado, mas hoje vejo como é importante investirmos tempo e recursos em coisas que julgamos boas, nos afastando daquelas, digamos, baratas ou “em promoção”.

Nesse contexto, podemos afirmar que a solução cooperativista de crédito que ofertamos a nossos sócios é muito boa, e não necessariamente precisa ter o exato significado do que seja caro, mas, por ser algo muito bom o que ofertamos a nossos sócios, precisa ter um custo razoável, mesmo que esse lhe seja exigido de forma indireta. Falo isso para entrar em um tema complexo que é a forma pela qual devolvemos o Capital Social a nossos sócios, já que, em conceito, esses recursos foram por eles aportados na Singular com a promessa de valorizá-los e retirá-los em um prazo certo.

As Singulares crescem e precisam cada vez mais de um bom Patrimônio para fazer frente aos desafios comerciais, e o Capital Social ainda será, por um bom tempo um enorme pilar para suportar esse desafio. Contudo, com o crescimento das Singulares e o passar dos anos, aproxima-se a prometida devolução de Capital Social para muitos dos sócios mais antigos, os quais tendem a ser os que possuem os maiores volumes. Portanto, caso eles exerçam esse direito, muitas Singulares poderão efetivamente conviver com o desenquadramento quanto à liquidez e falta de robustez patrimonial para continuar a crescer e se perpetuar.

Histórico: Ocorre que há 15, 20 ou 25 anos, tão logo a Singular foi fundada e gerou seu primeiro estatuto, diante de tantos desafios originais, é pouco provável que tivesse sucesso no aporte de Capital Social se informasse a seus primeiros sócios que esses valores só seriam devolvidos em um prazo muito elástico para aquele cenário, como 20 anos ou mais. Portanto, é comum nos estatutos encontrarmos a devolução do Capital Social definida para 10, 15 ou raramente 20 anos de associação. De tal modo, passado mais de uma década, vê-se que o tema precisa ser colocado à mesa e redesenhado conforme o novo cenário comercial da Singular e suas pretensões de pujança. Assim, de forma apenas sugestiva, desenhamos as duas propostas abaixo, a fim de que isso eventualmente possa ajudá-lo como guia em suas argumentações, quando da discussão desse tema em sua Singular. Esse tópico tende a ser espinhoso, mas quanto antes for redefinido, melhor para a sua Singular e para o modelo de negócio. Além do que, ele deve já ser repensado, pois, guardadas as devidas proporções, é possível ver-se nele a mesma complexidade da reforma previdenciária que, há algumas décadas, definiu parâmetros que pareciam ser coerentes mas que hoje explicitam carência de revisões, para que se alinhem a um cenário que se projeta para as próximas décadas.

Estratégia para devolução de Capital Social para PF: Hoje, a grande maioria de nossos associados são Pessoas Físicas, salvo algumas Singulares notadamente de empresários. Portanto, precisamos ter algo mais estruturado e de simples compreensão para ser apresentado aos nossos sócios quanto à estratégia de devolução de Capital Social, visando manter os benefícios e a perenidade da instituição. Abaixo trazemos uma macro sugestão para que possamos apresentar a nossos pares e propor sua aprovação à Assembleia, com o discurso da urgência, da mudança de cenários e da estratégia de nossa longevidade.

Vê-se que a tabela acima resume a proposta de devolução de Capital Social dos sócios Pessoa Física, sem negá-la, permitindo, assim, trazer aos novos tempos a relevância desse item para a perenidade da Singular. Abaixo, alguns temas perseguidos para que essa proposta tenha uma inicial coerência:

Estratégia para devolução de Capital Social para PJ: Observa-se que muitas Singulares já atuam com clientes empresariais sem que haja no estatuto uma menção de como ocorrerá a devolução do seu Capital Social. Sabemos que os empresários e suas empresas são muito mais complexos e instáveis do que as tradicionais Pessoas Físicas, e que foram constituídos para serem eficazes e gerirem seus recursos de forma racional. Assim sendo, para eles, o Capital Social integralizado na Singular não tem necessariamente a visão tão colaborativa que encontramos nas Pessoas Físicas, portanto, devemos ser coerentes com nossas exposições de motivos ao definir a devolução eventual desse seu Capital Social. Naturalmente essa devolução irá variar de acordo com as especificidades de cada Singular, mas tomamos a liberdade de sugerir, na planilha abaixo, um eventual ponto de partida para a revisão desse tema em seu estatuto.

Importante: Além de definir como serão os novos modelos de saque de Capital Social, mantendo as liberações dos valores para sócios com doenças terminais etc., é importante refletir/prever sobre:

Para pensarmos: Como diferencial para que possamos ter um ainda menor impacto no patrimônio da Singular, seria prudente deixar claro no estatuto que o início do computo do prazo para o pagamento da primeira parcela do resgate do Capital Social dar-se-á após o Banco Central homologar a Ata da Assembleia. O que efetivamente é um ato legal, mas ao mesmo tempo posterga em alguns meses o início do desencaixe do Capital Social por parte da Singular.

OBS: Em novo artigo enviaremos sugestões para definirmos a devolução estatuária de Capital para sócios que saem antes de terem atingido os parâmetros mínimos de idade e tempo de associação. Esses sócios são numerosos e nos demandam extrema atenção na gestão de todos seus impactos.

Reflexões finais: Revisando o ensinamento de minha tia que, após muito pensar decide por agir com base no entendimento de que: “se é bom, é caro uma vez só”, penso que nossos líderes deveriam ponderar a hipótese de decidir a agir de forma mais assertiva frente a melhorias estatutárias que tratam do resgate do Capital Social.

Esse tema é delicado e tende a ser naturalmente postergado, mas, se desejamos a perenidade de nossa instituição, é mister que o tratemos com firmeza e, na medida do possível, possamos atender aos interesses de todos os envolvidos.

Concordar é secundário. Refletir é urgente.

Ricardo Coelho – Consultoria e Treinamento com Foco no Cooperativismo de Crédito
www.ricardocoelhoconsult.com.br – 41-3569-0466 – Postado em 03/12/2018