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Muito em breve estaremos realizando pré-assembleias e assembleia geral para decidir como será o rateio das Sobras. Neste momento é oportuno recordar que nossos sócios devem ter uma vida socioeconômica ilibada para somar na construção de nossa sociedade, a fim de serem merecedores das Sobras, proporcionais à utilização dos serviços disponibilizados pela cooperativa.

Devemos lembrar também que o estatuto reza que qualquer sócio pode ser eliminado, caso cometa inadimplências nos compromissos assumidos junto à sua cooperativa, como atos financeiros ou sociais que comprometam a sustentabilidade e a credibilidade da Singular. Apesar destas prerrogativas, é raro vermos a aplicação da pena de eliminação do quadro social. Seja por complacência ou outras razões menos nobres, se opta por mantê-los como clientes e sócios, não deixando de lhes aplicar as cotidianas multas financeiras e juros de mora.

Dessa maneira, o que chama a atenção de nossa consultoria é que, se tratando de uma sociedade de pessoas, estes sócios infratores não sofrem o efeito negativo correspondente, quando do rateio das Sobras, participando igualmente do rateio destinado aos sócios que se comportaram de forma retilínea. E, em muitos casos, recebem Sobras até maiores que os bons clientes, pois só eles pagaram encargos punitivos. Algo para refletirmos.

Precisamos urgentemente reduzir estas distorções. Este artigo apresenta propostas defensáveis para que a Singular aplique de forma equalitária a verdadeira proporção entre aquilo que o associado contribuiu com a cooperativa e aquilo que ele causou de custos e despesas. Ou seja, que o associado tenha um reflexo punitivo financeiro previsto aos “sócios” que agrediram seus pilares de credibilidade e sustentabilidade, já que estes são os baluartes do sucesso de uma instituição financeira massificada a serem construídos pelos seus sócios. Além de nossas sugestões, veremos breves reflexões jurídicas feitas pelo Dr. Fábio Siqueira, sócio da Telles Siqueira Advogados, especialista em cooperativismo de crédito e parceiro desta consultoria.

1º FOCO: Pênaltis nas Sobras aos sócios que expuserem nossa credibilidade mercadológica

Como vimos, ações financeiras desregradas de alguns sócios, mesmo que involuntárias, denotam que estes não tiveram compostura societária e expõem a risco de imagem o nome e a credibilidade da Singular e, por isso, poderiam  estatutariamente ter sido eliminados da sociedade. Contudo, a simples manutenção na sociedade não poderia ser a prerrogativa para manter esses associados imunes de consequências pelos custos adicionais e riscos a que expôs a Singular. Mesmo que esses riscos sejam de ordem subjetiva como a redução do valor da qualidade da nossa marca no mercado – o que exigirá investimentos para sua recomposição original – ou custos mais concretos, como a elevação das despesas administrativas e provisões acima do previsto, não ocasionadas pela  grande maioria dos sócios “saudáveis”.

Ou seja, aceitamos que estes clientes desregrados financeiramente afetam negativamente nosso modelo de negócio, mas como somos uma sociedade de pessoas, eles também impactam toda a sociedade por não cumprirem seu papel de agente ativo de desenvolvimento e por causarem despesas acima da média dos sócios. Neste cenário muito específico, acreditamos que lhes é devido um ressarcimento destes “custos” diretos e indiretos, em especial se forem originados em uma das três ações desregradas abaixo.

Vamos refletir sobre três ações desregradas que devem refletir negativamente na distribuição de Sobras:

1ª ação desregrada: A emissão de cheque sem fundos (alínea 11 e 12)

  1. É sofrível a credibilidade de uma instituição financeira que não zela pela qualidade de seus clientes. Esta é explicitada no comércio pelo elevado número de seus cheques sem fundo.
  2. Não é mais possível legalmente punir com tarifas clientes PF que emitam cheques sem fundo.
  3. Clientes PJ que emitem cheque sem fundo sofrem apenas suaves encargos monetários diante do potencial estrago que se faz na credibilidade da Singular, que é o maior bem da instituição.

2ª ação desregrada: Adiantamento a Depositante (AD)

  1. Mesmo que o cliente pague tarifas e taxas punitivas, realmente ele só terá seus cheques pagos (ou compromissos honrados) na Singular por uma exceção especial dos gestores da instituição, já que não há saldo ou limite para tanto.
  2. Importante: Teve esta benesse sem qualquer tipo de reforço de garantia, ou seja, em seu benefício pessoal colocou em risco a sociedade.

3ª ação desregrada: Atraso de parcelas ou na liquidação de contratos com vencimento único

  1. Visando punir o sócio inadimplente, que unilateralmente descumpriu o contrato, aplicamos mora e multa nos créditos parcelados ou de contratos com vencimento único. Mas lembremo-nos que sendo também sócio, causou impactos societários que agrediram a sustentabilidade e credibilidade da instituição. Dessa forma, não podendo ser liquidados apenas com estas multas contratuais.

Assim sendo, caso o sócio incorra em uma ou mais destas atitudes de inadimplência ou exposição da cooperativa a riscos maiores, deve o associado ressarcir a sociedade pelos danos potenciais de imagem, despesas e custos financeiros acarretados pela sua descompostura.

Como aplicar: Aconselhamos que a Singular aprove em suas assembleias, em cumprimento à determinação do art. 8º da LC 130/09, a fórmula de cálculo aplicada na distribuição de Sobras e no rateio de perdas, proporcionalmente às operações realizadas ou mantidas pelo associado durante o exercício, de forma que se considere os desregramentos havidos durante o ano, conforme  regulamento aprovado em assembleia.

Assim, com parâmetros objetivos e explícitos, baseados em valores estimados dos custos extras originados pelo sócio desregrado financeiramente, institui-se em regulamento um valor de pontuação que será identificado com o correspondente valor monetário do ressarcimento deste ônus que acarretou à sociedade. Assim, novamente lembrando que já poderiam ter sido sumariamente eliminados na data que incorrerem em uma destas faltas graves.

A tabela de ressarcimento dos custos por sócios desregrados financeiramente seria algo próximo de:

Importante:

  1. Estes valores debitados nas Sobras do sócio infrator seriam convertidos ao FATES, visando a educação financeira da totalidade dos sócios, e evitando, assim, ano após ano, a prática destes atos falhos.
  1. No caso das Sobras do sócio não suportarem estas reduções devidas, zera-se sua participação nas Sobras, zerando também seu saldo negativo de impacto nas Sobras, decorrente dos “tropeços” do ano passado. Deve-se então agir de forma a orientar o infrator sobre estas indesejáveis práticas societárias, alertando-o formalmente que, em caso de reincidência, poderá vir a ser eliminado da sociedade.

2º FOCO: Pênaltis nas Sobras aos sócios que pagam juros de origens punitivas

De uma forma geral, é incoerente considerar nas Sobras os juros pagos pelos sócios oriundos de atrasos contratuais ou uso desregrado da conta corrente acima do saldo ou limite. São desvios de conduta que impactam sobre os custos da sociedade, portanto é incoerente premiar estes sócios utilizando na base de cálculo das Sobras os encargos sociais pagos em razão da inadimplência contratual aplicados no ano anterior. Seria um prêmio pelo seu mau comportamento. Algo insano estatutariamente e diante da inteligência econômica cooperativa, que tem a mutualidade como pilar.

Assim sendo, deveríamos excluir das Sobras:

3º FOCO: Pênaltis nas Sobras para os sócios de alto risco em operações ativas 

Seguindo a lógica deste artigo, propomos que na assembleia se defina que qualquer cliente que esteja em 31/12 em risco “D” ou acima não participe de nenhum valor nas Sobras, sendo suas Sobras destinadas ao abatimento da sua dívida com a sociedade.

Ocorre que um cliente com risco “D” leva a cooperativa a provisionar 10% de sua dívida em 31/12, sendo este valor deduzido das Sobras a serem distribuídas a todos os sócios na próxima AGO. Ou seja, um cliente com uma dívida inadimplente de R$ 10.000,00 impacta as Sobras em R$ 1.000,00, e pode vir a se tornar um risco “H”, reduzindo as próximas Sobras em 100% desta dívida. É insano distribuir qualquer valor como Sobras para este cliente que impactou o resultado em R$ 1.000,00, ainda mais se for crédito em conta corrente.

Sabemos que o risco no crédito faz parte de nossa natureza comercial, mas isto deve estar internalizado na taxa de juros que aplicamos na operação. Contudo, sabemos também que as Sobras têm a característica de premiar os bons sócios, extirpando os “mau pagadores” societários, seja este rótulo voluntariamente desejado pelo sócio ou não. Portanto estes clientes com risco de crédito já potencializado e formalizado não são merecedores de qualquer parte nas Sobras, pois penalizaram o resultado da sociedade.

Uma breve observação: este tema específico foi tratado de forma breve em um artigo escrito há mais de dois anos, mas percebemos que algumas Singulares o adotam parcialmente, retirando das Sobras de clientes com risco “D” (ou mais) apenas a parte que lhes seria devida pelos juros pagos. Permitindo assim, que ainda tenham ganhos nas Sobras pelo saldo em Depósito à Vista e Depósito a Prazo. Entretanto, a prática demonstra que dificilmente este tipo de cliente inadimplente teria saldo em aplicações em Depósito a Prazo ou saldo médio representativo em conta corrente no ano anterior a AGO. Assim, parece-nos mais coerente excluí-lo por completo das Sobras.

4º FOCO: Pênaltis na assembleia para sócios inadimplentes 

A democracia nas cooperativas é exercida, sobretudo, com base no direito sagrado dos sócios de votar e ser votado. Mas, para exercer cargos estatutários em instituições financeiras, como são as cooperativas de crédito, é obrigatório aos pretendentes o cumprimento dos requisitos normativos previstos pelo Conselho Monetário Nacional – CMN, inclusive ter reputação ilibada e estar adimplente com suas obrigações contratuais. (Res. 3.041/02, art. 2º, I e V).

O mesmo não acontece com o direito de voto dos sócios, que é um direito social. Mesmo que esteja inadimplente com suas obrigações perante a sua cooperativa, o sócio continua tendo o direito de voto em assembleia. Essa interpretação decorre da regra prevista no art. 37, inciso III da Lei 5.764/71, no sentido de que a cooperativa deve assegurar a igualdade de direitos dos associados, sendo-lhe proibido estabelecer restrições de qualquer espécie ao livre exercício dos direitos sociais.

Por outro lado, em condomínios é regra legal que um morador inadimplente não possa votar nas assembleias gerais, já que está verdadeiramente atritando os estatutos, a integridade e a sobrevivência socioeconômica do empreendimento. Seguindo esta lógica estatutária, no sentido de que a cada direito corresponde uma obrigação, propomos a reflexão sobre se é justo que o sócio inadimplente continue tendo direito de voto em assembleia.

Nesse sentido, é oportuno que o movimento cooperativista, a exemplo dos condomínios, proponha no Congresso Nacional alteração no inciso III do art. 37 da Lei 5.764/71, para permitir que os estatutos das cooperativas estabeleçam restrições de voto a associados inadimplentes com suas obrigações contratuais e estatutárias, mediante comprovação e prévia notificação ao mesmo.

Reflexão final: visando a premiar os bons sócios e a competitividade e perenidade da Singular, seus líderes devem adotar medidas estatutárias para que haja “pênaltis nas Sobras para sócios desregrados financeiramente”.

Concordar é secundário. Refletir é urgente.

Ricardo Coelho – Consultoria e Treinamento com Foco no Cooperativismo de Crédito

www.ricardocoelhoconsult.com.br – 41-3569-0466 – Postado em 03/01/2012