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O impacto da baixa dos juros da Caixa e BB no cooperativismo de crédito

A notícia abaixo sinaliza que nós, cooperativistas de crédito, devemos colocar a barba de molho, pois irá, sim, afetar nossos diferenciais competitivos. Agora, mais do que nunca. É a hora de buscar o eficaz relacionamento com nossos sócios como antídoto para estes tsunamis que doravante irão surgir. Relacionamento, sim, e não a frágil decisão de focar na venda de um produto ou serviço isoladamente.

O centro da questão

Nesta segunda – 09/04/2012 – os grandes bancos públicos – BB e Caixa –  irão anunciar taxas de juros de primeiro mundo, ou seja, uma jogada política e populista de enorme envergadura, mas de efeitos de médio e longo prazo nada saudáveis para a livre economia de mercado e, portanto, para nosso modelo de negócio.

111 - O IMPACTO DA BAIXA DOS JUROS DA CAIXA E BB NO COOPERATIVISMO DE CRÉDITO

Efeito perverso no mercado de ações

Após o anúncio da medida no final desta semana, as ações dos bancos privados chegaram a cair 6% em um dia, inclusive o do Banco do Brasil. Aí mora o perigo. Pois a Caixa tem um caríssimo custo operacional e é focada no fomento e nos repasses de benefícios sociais. Portanto, vive recebendo aportes a fundo perdido do governo para dar continuidade as suas atividades sem ter foco macro na eficácia comercial. Mas não podemos falar o mesmo do seu coirmão Banco do Brasil. Ele é uma empresa de capital aberto e deve satisfação e retorno a seus acionistas, dos quais um deles é o governo federal. Ou seja, os acionistas do BB irão exigir retratações pelo uso de seus investimentos com viés político. Eles são investidores esclarecidos e não irão aprovar que suas poupanças se dilapidem por uma ação populista, intempestiva, incoerente e de eficácia macroeconômica questionável.

Um pulo mercadológico da Caixa e BB depois de uma canetada

Sem dúvida na crise internacional de 10/2008, os bancos privados retraíram seus créditos, perdendo mercado para a Caixa e BB, haja vista estes terem aproveitado para alavancar suas carteiras de financiamentos empresariais. Contudo, não tiveram o mesmo efeito sobre suas carteiras de pessoa física, a não ser aquelas que tinham vínculo com benefícios sociais como aposentadoria e financiamentos de veículos.

Seguindo esta mesma lógica, estes bancos públicos devem novamente avançar seu posicionamento mercadológico, mas agora não pela sua eficácia comercial, e sim por uma determinação política – uma canetada – com a alegação e intenção dita de correção do fluxo da economia. Estes bancos se não fossem públicos já teriam quebrados várias vezes, após terem sido usados em ações políticas e abruptas, haja vista as inúmeras vezes que foram socorridos com enormes recursos a fundo perdido.

A história se repete

Esta ação terá um ruidoso e desnecessário efeito no mercado, lembrando muito quando em 1990 Collor chamou nossos carros da época de carroça e, sem critério, abriu o mercado para os importados. Claro que após duas décadas podemos aproveitar desta abertura, mas não há dúvida que o caminho não foi o mais coerente. Ou por que não lembrar de 1990 quando a ministra Zélia, visando a atacar um problema estrutural da economia, usou como corretivo o bruto confisco da poupança, penalizando toda uma geração que poupava em confiança aos governos que a antecederam.

Devemos nos lembrar de outra ação desastrada muito parecida com esta, feita em 2003 pelo implodido Banco Popular, hoje um cinzento setor do BB. Ele dava R$ 50,00 de crédito a taxa de juros baixa para todo cidadão brasileiro que não tivesse o nome sujo, com objetivo de “bancarizá-lo”. Diziam estar testando sua adimplência no crédito, na crença incongruente de que as pessoas humildes são, por natureza, empreendedoras e que honram seu nome. Consequência: tiveram uma inadimplência estratosférica e um fracasso total do projeto. Prejuízo faraônico para a sociedade.

Governança foi abatida

É inconsequente fazer estas ações populistas com o dinheiro do contribuinte, ainda mais em período eleitoral de um governo de esquerda moderada, ferindo brutalmente a Governança, que ainda nem atingiu a puberdade.

Os acionistas do BB irão fazer entrar cisco no olho deste projeto, se posicionando em pé de guerra. Esta enorme queda de rentabilidade fará com que os acionistas do BB tornem a gestão desta instituição um tormento além de uma procedente guerra judicial. Esta ação já mina fortemente o valor das ações do BB, acarretando terríveis sequelas ao modelo acionário de nosso mercado. Também colocou em cheque todo o projeto de Governança que dava transparência e governabilidade das instituições com ações em bolsa (ex. BB).

Inadimplência: agora, novamente basta o cliente ter o nome limpo e sem aval ou histórico na instituição, para que possa acessar uma linha hiper bonificada. Assim, desprezando os profundos estudos que determinam que a inadimplência deve ser precificada e aplicada na taxa de juros. Ao expurgá-la, algo errado e traumático irá acontecer. Inadimplência em alta e não precificada. Isto é brincar de roleta russa com um revolver totalmente carregado. Boa coisa não resultará, mas como tudo nestes bancos, por terem seus executivos com viés políticos, nada lhes acontecerá, e o errado será o mercado ou uma outra muleta qualquer.

Devemos lembrar sempre que a Caixa e BB têm histórico de serem apenas medianos em suas ações de cobrança da inadimplência de suas carteiras massificadas. Portanto, imaginemos como ficará doravante este processo, se sua carteira tende a triplicar em um curtíssimo espaço de tempo. Portanto, mais inadimplência, menos resultados, menos atratividade, menor valor da ação, custo maiores de capitação, e por fim, veremos novamente o governo aportando recursos externos para equilibrar as finanças da Caixa ou do BB. E assim, menos recursos para educação, saúde etc.

Vale ressaltar que um enorme percentual dos tomadores de crédito PF e os empreendedores tentem a já estar em seu limite saudável de endividamento. Dessa forma, o risco agrava-se, seja pela elevação destes atuais limites ou pela chegada de novos clientes sem histórico ou experiência diante destas dinâmicas e traiçoeiras linhas massificadas.

Qualidade do atendimento

Outro fato chama a atenção. Se apenas 20% da massa de novos clientes projetados nesta ação procurarem o crédito “de graça”, ficará questionável o nível de seus atendimentos, já que atualmente não são balizadores de qualidade em atendimento. Ou seja, é baixa a qualidade dos serviços à população e clientes da Caixa e BB, em especial pelo custo de sua folha comparada a qualidade dos serviços dos bancos privados. Assim, ganharão mercado apenas uma canetada política, já que nada mudou em sua essência mercadológica.

Tenho conta da Consultoria na Caixa há cinco anos, movimentando um bom fluxo de recursos sempre pela internet. Nunca recebi uma visita ou um telefonema se quer. Meu cadastro não é atualizado desde a abertura. Creio que este atendimento tende a piorar, se isto é possível. No BB o atendimento a clientes medianos e pequenos também não é tão diferente. Nos bancos privados há uma pressão para que haja reciprocidade, e os bons clientes ou o potencial são monitorados para a perfeita parceria.

Portanto, após uma canetada da presidente, não podemos esperar que sem nenhum investimento em pessoas e equipamentos estes bancos sejam mágicos para dar vazão a este tsunami de demandas. Não será uma reunião com os gerentes das agências na quinta na véspera da páscoa que mudará este cenário, permitindo que se mude a logística da agência para absorver o impacto da enorme ação, que será potencializada pela forte mídia. Portanto, torceremos para que a ação não tenha nem 10% do projetado de eficácia quanto à elevação de fluxo de clientes novos a estas instituições, para que não cheguemos a verificar um padrão sofrível de qualidade de atendimento.

Por fim, devemos ser prudentes ao acreditar que o caixa automático e até o internet banking irão fazer sozinhos o papel de atender esta nova demanda por créditos e serviços. Focar fortemente no crédito é uma estratégia comercial perigosa, em especial para instituições massificadas. Devemos sempre buscar minimamente a coerência do relacionamento comercial do cliente com sua instituição financeira e não aceitar que nos usem como financeira, tornando-os “taxeiros” e descompromissados com o aprimoramento do relacionamento para ganhos estruturados e longos.

Fonte e custo do funding

Outro ponto de atenção que poderá minar esta ação é que a Caixa e BB anunciam que terão bilhões para emprestar a custo baixíssimo. Não há mágica. Todo recurso a ser colocado a disposição destas instituições para fazer frente a este mega projeto tem seu custo balizado pela Selic e poderá ficar ainda mais caro pela maior carência de recursos livres a disposição do mercado. Assim, nesta linha de pensamento, devemos lembrar que a Selic baliza o custo mínimo do dinheiro no Brasil, e que este está muito próximo da nova taxa média destes bancos, isto sem considerar outros custos.

Portanto, a conta racional não fecha e, para agravar, o custo do dinheiro é muito influenciado pela despesa com os salários, sendo que nestes bancos este custo chega a ser três vezes acima dos bancos privados. Assim, provavelmente irão apresentar prejuízo já nos próximos anos, pois suas receitas levaram uma dura queda, com elevação dos custos administrativos e de captação. Não se sobrevive no mercado vendendo melancia mais barato do que se compra, ainda mais tendo despesas administrativas tão acima do mercado.

E quanto ao funding, não é oportuno acreditar que a tábua de salvação serão os recursos originários do depósito à vista. Diferente do que muitos pensam, ele tem um custo elevado de processo, administrativo, compulsório, e, para piorar, ele oscila inversamente a liquidez da economia. Ou seja, ele cai quando mais a população precisa dele, e cresce quando esta está solvente. E sua média não é uma boa métrica para uma carteira de crédito de prazo acima de seis meses, já que agride os preceitos de Governança. Portanto, Depósito à Vista é uma nervosa e custosa fonte de funding e não poderia alicerçar uma ação desta magnitude.

Resultado da Caixa e BB para 2012 e anos seguintes

Esta ação irá elevar a carteira de crédito destes bancos, mas não seus resultados, além de agravar sua inadimplência e a satisfação de seus necessários acionistas (no caso do BB).

É uma ação política e intempestiva para o nosso momento econômico e desrespeita o fluxo da história. Certamente o mercado irá cobrar uma dura fatura destes bancos, pois há uma enorme redução da receita, sem cortar qualquer despesa. A conta não fecha.

Vale ressaltar que é uma ação mercadologicamente descabida, pois beneficia toda a carteira de clientes, sem qualquer respeito à história, aderência e a adimplência do cliente. E nunca foi saudável ter na carteira clientes “taxeiros”. Somos muito mais que financeira!

Reflexão final: este artigo traz reflexões para que junto a seus pares ponderem os prováveis impactos desta novidade mercadológica imposta pela caneta social da Dilma em ano de eleição. Apenas sugerimos que entendam o seu cenário local e não tomem nenhuma ação nestes próximos 30 dias, pois há uma boa possibilidade de ser uma “marolinha” para nós e um tsunami para a Caixa e BB.

Lembrem-se: muita calma nesta hora.

Concordar é secundário. Refletir é urgente.

Ricardo Coelho – Consultoria e Treinamento com Foco no Cooperativismo de Crédito

www.ricardocoelhoconsult.com.br – 41-3569-0466 – Postado em 07/04/2012