HSBC – Um Golias em terras de guerrilhas

Estamos em vias de conhecermos o desfecho do HSBC. Ao formalmente explicitar que irá vender suas posições no Brasil, México, Reino Unido e China, a instituição passa da posição de competidor para a de um debilitado vendedor de algumas ainda não tão ricas posições.

Mas porque os líderes do cooperativismo de crédito devem ficar atentos? Além das exposições de motivos aqui explicitadas, peço que releiam o artigo: “Teoria de Estresse dos Medianos frente ao Cooperativismo de Crédito” de 12/2013, onde pondero que no mercado não há espaços para competidores medianos, e também releiam nossos prognósticos de 01/2010 contidos no artigo: “O futuro dos bancos médios – Inferências”.

Acontecerá algo discreto e muito saudável para as Singulares mais ágeis comercialmente, tal qual aconteceu com a privatização de alguns bancos públicos. Elas se beneficiaram muito com a “conquista” de novas contas e com a concentração de negócios, pois é muito grande o alarido dessas vendas e também porque os melhores clientes tendem a ficar muito receptivos a instituições que possam lhes dar uma atenção e soluções ainda melhores que o seu tradicional banco, o qual passa pelo desgastante processo de venda. Os clientes mais complicados (risco, baixos volumes, locais desatendidos pela Singular…) devem fazer parte da carteira a ser vendida para a nova instituição compradora.

Importante frisar que, no caso do HSBC nosso modelo de negócio já deveria ter adotado há alguns meses medidas de guerrilhas para “conquistar” estes melhores clientes deste banco a ser extinto de nosso mercado, sendo que muitos deles tendem também a ter um relacionamento com a sua Singular. Bons clientes não aceitam pacificamente a ruptura do relacionamento unilateral do HSBC, assim, tendem a ser conquistas fáceis, desde que as promessas e boas soluções sejam eficazes. Esta deve ser uma ação discreta, mas também é preciso que fiquemos atentos para que o residual comercial de baixa qualidade deste Golias caia longe de nosso modelo de negócio.

Como fica o mercado se o comprador for:
ITAÚ – Um banco tradicional, conhecedor de nosso astuto varejo, ágil em tecnologia, muito eficiente na retenção de seus bons clientes e no atendimento de empresas. Em conceito seria o banco com o melhor perfil para comprar o HSBC, contudo poderá encontrar dificuldades legais caso venha a propor a compra de 100% deste banco, haja vista os preceitos de monopólio. Vem historicamente comprando vários bancos, como Banerj e Banestado, e recentemente o Unibanco. Assim, tem expertise para essas incorporações, e sabe que está acabando as opções de compras relevantes. É importante lembrar que o HSBC já é de seu cardápio, pois comprou recentemente as operações deste banco no Chile. Para o mercado e para os clientes do HSBC seria a melhor opção.

BRADESCO – Com regras tradicionais de hierarquia e ascensão profissional esse banco popular é um exímio competidor quando se trata de fazer resultados com soluções financeiras para clientes de uma casta um pouco inferior. Muitas delas advindas do banco postal (hoje com o Banco do Brasil) quando ainda havia uma grande massa de brasileiros “desbancarizados”. Por mais que o Bradesco tenha o segmento Prime, ele é pouco representativo no modelo de negócio. Dessa maneira, tudo leva a crer que ele está focando em pequenos e micro empresários de bairros populares. Chegando cedo, atende a seu modo estes empreendedores e a riqueza local. Quando os concorrentes avançam para este mercado, os bons clientes tomadores e investidores já aprenderam “os caminhos das cabras”, desenhado pelo Bradesco. Com esta compra o Bradesco recuperaria a liderança dos bancos no Brasil, contudo também pode ter sua intenção de compra bloqueada por problemas de monopólio. Para os clientes do HSBC e para o mercado será um descompasso.

SANTANDER – Acompanho de forma macro os passos do Santander. Em 11/2007 postei o artigo: “Santander! Sabe mesmo jogar nosso jogo” e, em 01/2209, vendo sua extrema criatividade e voracidade na obtenção das suas receitas, tomei conhecimento de algo muito audaz que me fez postar o artigo: “Comissão de manutenção de Limite de Cheque Especial”. Uma semana depois da publicação do meu artigo, o Santander suspendeu esta “criativíssima” tarifa. Assim, nestes meus mais de 40 anos de mercado, conheço de forma de hipercompetição e de externada empáfia de seus líderes junto a seus subordinados, muitos ainda oriundos do Banco Real, o qual foi incorporado pelo Santander em 2009.
A forma de competir do Santander foca no relacionamento de curto prazo, algo distinto do Banco Real, o qual primava pela edificação de um relacionamento primoroso com seus melhores clientes, em especial os de maiores renda. Com a fusão, esta nata de clientes do Banco Real saiu do Santander por não mais se identificarem com o perfil do banco comprador. Para o mercado e para os clientes populares do HSBC pouco muda, mas para os melhores clientes do HSBC haverá uma real perda de qualidade no atendimento. Contudo, vejo que neste cenário haverá apenas um pequeno desvio de rota, pois, seguindo minhas premissas de que não há espaço para competidores médios, o Santander será o banco da vez para ser vendido após o HSBC. Assim este movimento de compra pelo Santander será redesenhado em breve, só que ele na posição de vendedor de sua posição.

BANCO ESTRANGEIRO – Temo que não seja um bom investimento para uma instituição estrangeira. Seja qual for a instituição, certamente não terá posições reais de varejo financeiro em nosso mercado. E por desconhecê-lo, tenderão a manter um controle firme e teórico que abafaria ainda mais a co-gestão necessária na transição com os atuais gestores líderes do HSBC. A alta cúpula de um banco comprador estrangeiro tende a colocar na liderança local pessoas que já têm histórico interno em seu banco, mesmo que em outros mercados, gerando uma perda indesejada de energia e tempo. Algo que ainda é visto no estrangeiro HSBC. O nosso mercado de varejo massificado não tem mais espaços para entrantes que não saibam jogar este discreto e guerrilheiro jogo. Esses bancos estrangeiros precisam também ser simples e relegar a um plano mediano as soluções tecnológicas como seu maior canal de soluções. Essas soluções tecnológicas têm que existir, mas se forem destacada, o relacionamento de valor não existirá, e assim sendo, terão uma carteira volátil e descompromissada com o seu futuro. Guardada as devidas proporções, devemos nos lembrar do BBVA – Banco Bilbao Vizcaya Argentaria (no Brasil chamado de BBV) que ao comprar o falido Excel Econômico em 1998, tentou aplicar suas arrogantes crenças comerciais no Brasil, obtendo pífios resultados. Em 2003 foi vendido para o Bradesco.

Qualquer banco estrangeiro poderia, na eventualidade de vir adquirir o HSBC, ler atentamente nosso livro: “Repensando Banco de Varejo de 1996” – hoje já na sua terceira edição. Escrevi este livro visando ter um material mais substancializado para apresentar a diretoria do Bamerindus na época (e depois aos líderes locais do HSBC através das novas edições). Nele tentei demonstrar o quanto eram simples e práticas as propostas para fazer um eficaz banco de varejo massificado. Sugiro ainda que estes compradores estrangeiros analisem os mais de 200 artigos postados em nosso site sobre o nosso mercado. Este rico compêndio permite análises e reflexões de como acreditamos que uma instituição financeira de varejo deva jogar para ganhar.

Importante frisar que, seja qual for o banco de varejo nacional que vier a comprar o HSBC, haverá sobreposição de agências, clientes e fornecedores, inclusive de soluções tecnológicas. Também devemos nos atentar para o fato de que sempre quem compra é que mantém seus processos e funcionários bem protegidos, e tendem a considerar as soluções e profissionais comprados como necessários durante a transição para dar calma aos clientes comprados e repassar os processos técnicos complexos advindos do processo de fusão. Mas, após a conclusão do processo de compra formal e tecnológico, estes recursos passam a ser menos relevantes, sob a alegação de custo e sobreposições de funções ou de agências.

Voltemos ao HSBC. Vamos analisar a depreciação do preço do HSBC que se agrava nestes 18 anos em nosso mercado. Tive a oportunidade de trabalhar por 8 anos no HSBC após ele ter comprado em 1997 o Bamerindus na bacia das almas, banco onde trabalhei por outros 20 anos. Vivi na pele sua apregoada supremacia e prepotente crença de que a forma como ele fazia negócios estava certa e que bastava aplicarmos seus modelos importados que suas operações no Brasil seriam um sucesso. Afirmo que foram muito mais erros comerciais do que acertos, tanto que ele nestes 18 anos de mercado já teve inúmeros líderes (e diretrizes mundiais) que fizeram o plano de negócio subir aos céus e descer ao chão, sem que tenham conseguido um rótulo de banco elitizado, popular, de investimento, ou outro qualquer. Eles nunca entenderam que o Brasil não é para teóricos ou estrangeiros não humildes. Somos únicos, como são os países em desenvolvimento. Não há espaço para teorias ou cópias puras de soluções de êxito externo. Mesmo com margens comerciais elevadíssimas, chega um momento em que os sucessivos erros cobram sua fatura em nosso mercado. Há dezenas de provas dessa afirmação, e o HSBC é um delas.

Outro fator que corroí o preço do HSBC é o fato dele estar sendo investigado na Suíça, na França e no Brasil por dar guarida a contas secretas de seu private bank na Suíça, permitindo que clientes milionários sonegassem impostos. Também é notório que sua filial brasileira deu um prejuízo de 500 milhões em 2014 e que ela também tem um enorme potencial passivo trabalhista, agravado pelas suas diretrizes descompassadas no Brasil como a que formaliza aos seus funcionários que devem tomar banho e escovar os dentes todos os dias. Um descalabro que mostra como é frágil a arrogância quando se atua em diversas culturas ou se subestima o intelecto de alguma delas. Passivos trabalhistas de bancos comprados é realmente uma grande bomba que irá estourar na mão do comprador, se o acordo de compra for mal elaborado. Por fim, se observa que discretamente há uma gestão de custos por anos a fio visando resultados a qualquer preço para remessa a debilitada matriz, seja pelas graduais demissões, pouco investimento em mídia ou pelas taxas de juros elevadíssimas, além do fechamento de 450 agências desde a compra do Bamerindus – hoje são apenas 850.

Não podemos também esquecer ações temerosas comercialmente que afetaram o valor e o posicionamento do HSBC no Brasil, como a compra intempestiva da Losango, que tinha por objetivo financiar o consumo de baixa renda. Não conseguindo nem mesmo tocar de forma competitiva um banco de varejo em nosso mercado, abriu um tentáculo em algo que não dominava. Um projeto de milhões em perdas.
Por fim, quanto à depreciação do HSBC ainda devemos considerar a natural saída silenciosa dos bons clientes investidores para bancos mais estáveis. Algo esperado, haja vista que usualmente estes têm conta em mais de um banco ou mesmo em uma cooperativa de crédito.

Reflexão Final: Nos próximos anos acredito que serão raras as oportunidades como essa de comprar um banco privado mediano em nosso país. Os restantes bancos públicos, salvo raras exceções, darão mais dor de cabeça do que resultados para os bancos que os adquirirem, em especial pelo forte viés político adquirido nestes 12 últimos anos de governo. Portanto, apesar do HSBC ser rotulado como um banco com problemas de posicionamento mercadológico e em sua postura ética, não há dúvida de que ele é o manjar dos deuses de nosso mercado. Fica a dúvida se quem o comprar saberá rapidamente apreciar suas delícias e descartar suas maledicências.

Aos cooperativistas de crédito fica a dica: Avancem discretamente desde já sobre os melhores clientes do HSBC, inclusive reforçando laços comerciais com alguns deles que já mantêm algum relacionamento conosco. Contudo, observem que muitas metas, principalmente de captação de recursos e novas contas, já podem estar sendo facilitadas pela procura discreta de nossas soluções por bons clientes do agora debilitado HSBC.

Se demorarmos mais de um mês para montarmos um plano de ação focado na guerrilha comercial, perderemos esta boa marola cada vez mais rara.

Concordar e secundário. Refletir é urgente.

Ricardo Coelho – Consultoria e Treinamento com Foco no Cooperativismo de Crédito
www.ricardocoelhoconsult.com.br – 41-3569-0466 – Postado em 04/06/2015