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Fusão – Sinônimo de competitividade

Ter resultados positivos, rentabilidade, crescimento orgânico, etc., não é necessariamente um sinal de boa gestão comercial ou garantia de perpetuação do negócio. Eles podem ter sido obtidos graças a um mercado ainda comprador e/ou sedento por uma modalidade de oferta, como crédito, ou ainda via artifícios contábeis ou de engenharia financeira.

Esta constatação também se aplica às Cooperativas de Crédito (doravante grafada como CC). Até 2004, as CC experimentaram uma bonança mercadológica. Após, passaram a conviver em um mercado mais austero, o qual, gradualmente, vem expondo eventuais deficiências de gestão mercadológica ou de competitividade deste modelo de negócio. A taxa Selic cai. O elástico estica. Este “novo” e áspero mercado as obriga a rapidamente repensar seu negócio, seu discurso e adotar novas atitudes até então impensadas. Aqui surge um ponto de atenção, pois esta agilidade mercadológica não é tão facilmente encontrada nas tradicionais CC.

Levando em conta este cenário e considerando o estágio atual das CC, seria aconselhável que todo novo estudo de mercado e/ou revisão do modelo de negócio, debatam explicitamente e sem paixão, a correlação do trinômio: Gestão, Auditoria e “Fusão”. Quanto mais rapidamente for esta compressão e as mudanças de atitudes, melhores serão os alicerces para a perpetuação comercial das CC.

Isto posto, seria prudente que os discursos dos princípios cooperativistas sempre precedam de reflexões sobre o real cenário mercadológico, assim terão muito mais eco ao encontrar novas plateias, perpetuando este interessante modelo de negócio. Vejamos algumas constatações para balizar estas reflexões:

Visando dar objetividade ao texto, utilizamos o termo “fusão” como sendo a “união” de duas CC saudáveis e “incorporação” quando uma delas apresenta dificuldades contábeis/comerciais e é socorrida por uma CC saudável. Portanto, não nos preocupando com as nomenclaturas e normativas que regem o modelo.

Paradigmas da Fusão

Para o mercado, o modelo CC é um negócio como outro qualquer e, portanto é saudável que ocorram graduais fusões, em especial por que as partes estão “sólidas” e concorrerem em um mercado financeiro agressivo e tendendo a saturação. Assim, de forma organizada e gradual, buscariam ganhos de competitividade e escala (ativos, passivos, administrativos, operacionais, etc.).

Já as incorporações são vistas pelo mercado com extrema atenção. São tratamentos de UTI para singulares com reais problemas contábeis, mas normalmente precedidos de problemas políticos e/ou de gestão. Estas singulares precisam ser “incorporadas” de forma rápida e discreta, mesmo que com perdas financeiras para as coirmãs, pois uma possível liquidação será nefasta ao modelo.

Por que ainda as fusões no modelo de CC não ocorrem na quantidade e velocidade necessária? Aparentemente por dois fortes motivos. O primeiro é racional. A CC foi criada com intuito de ser perpétua, portanto, far-se-á o possível para mantê-la viva. O segundo é mais delicado. Desde sua criação, o negócio é permeado por enorme carga emotiva em todas as suas etapas. Isto, por si só, já é um ponto de atenção mercadológico, pois a emoção favorece pouca razoabilidade comercial. O que é desaconselhável em um mercado agressivo.

Para exemplificar, basta observarmos que alguns gestores tratam a “SUA” CC como se fosse um “FILHO” que pode até cometer “pequenos” erros, mas sempre merecerá uma segunda, terceira, quarta… chance. Eles acreditam que sua CC é composta por associativistas fervorosos, e que seu “mercado” é cativo, não afeto ao mercado atendido pelas instituições financeiras massificadas. Ledo engano. Lembremos: De tanto repetirmos meias verdades, acabamos acreditando nelas. Não podemos ser mais realista que o Rei. Demanda não se cria. E que o mercado é único, e nada o tornará maior do que seu próprio tamanho real.

Um reforço aos paradigmas da fusão, e que até recentemente, o mercado foi favorável ao crescimento de toda e qualquer instituição financeira, inclusive para as CC que atuavam com mediana eficácia na gestão. Neste confortável cenário, se observou que as raras fusões foram precedidas de visão clara de mercado, busca proativa de ganho de escala e gestos de humildade da singular menor. Esta, em detrimento do seu pequeno tamanho, e de sua força financeira e política, gradualmente cedeu seus melhores cargos e posições políticas.

Mas, mesmo nestas raras fusões, este saudável processo pode não ter analisado detalhadamente se era eficaz a gestão comercial das singulares envolvidas. Isto implica dizer que, se o novo quadro diretivo não for profissional na condução comercial desta nova instituição, o mercado só permitirá pífios e decrescentes resultados, estes calcados em clientes e negócios remanescentes.

Para encerrar as abordagens sobre paradigmas, cabe uma oportuna reflexão. Os pilares do cooperativismo: associativismo e mutualismo, para que possam se desenvolver precedem da eficácia do 3º pilar: O empreendedorismo . Ele tem que ser eficaz quanto a gestão, mercado, rentabilidade etc. Caso contrário, não há sustentação para o modelo.

Fusão – Muitas estrelas, pouco céu

O modelo CC tende cada vez mais a buscar saudáveis fusões e evitar drásticas incorporações. Isto os obriga a ser ainda mais politicamente corretos, entendendo que o ego humano é uma eterna chama, e que é prudente fazer bom uso desta energia. Ou seja, de uma forma figurativa, o modelo cooperativista de crédito terá a cada dia menos céu para acomodar tantas “estrelas”, propiciando um oportuno aumento do “canibalismo estelar”. O ego humano permeia todos nós, e certamente está em cada uma das Unidades de Atendimento, Singulares, Centrais, Confederações e nas instituições de controles oficiais.

Por mais que uma fusão seja, em conceito, algo hiper saudável, lá estará latente o ego humano e deve ser habilidosamente tratado. Imaginemos então o estresse do ego quando de uma incorporação, onde realmente uma das partes está com o “filho” (“sua” CC) na UTI. Sabemos que em assuntos permeados por emoção, é quase improvável que algum dirigente admita o fracasso. Na visão destes tudo e todos conspiraram contra o seu “filho”. Agrava-se esta situação, pois, como tendem a ser pessoas de destaque naquela sociedade, fica quase impossível acreditar que irão admitir que foram incapazes de conduzir a bom termo um projeto que lhes vendeu. Sabe também que este “fracasso” ecoará negativamente por muitos anos no seu reconhecimento social.

Neste cenário tão delicado, seria oportuno que os mentores do modelo iniciassem imediatamente programas pontuais e explícitos, indicando o caminho da fusão como algo necessário, urgente, e determinante para o este novo cenário comercial. Estes programas devem, preferencialmente, incutir nos dirigentes das singulares, centrais e confederações uma mudança de postura comercial visando a perpetuação deste modelo de negócio.

Outro delicado aspecto que deve ser motivo de ponderações dos mentores do modelo CC e a tão alardeada Governança Corporativa. Ela, por si só, não é garantia de sucesso do modelo de negócio, mas sua inobservância sim. Dela derivam inúmeras reflexões sutis que devem ser analisadas, como:

Findando esta abordagem sobre o mundo estelar. Todo o mercado está reduzindo o número de estrelas. Vejamos o destaque do caderno “Dinheiro” da Folha de São Paulo de 07/04/2007: “Brasil Telecom e a Telemar definem estratégia para fusão, visando barrar o avanço agressivo da Telefônica e Telmex no país”. Por que o tema “fusão” seria diferente com as CC? Vamos fortalecer os bons projetos, gestores e mercados. Só assim o modelo das CC poderá ser socialmente eficaz.

Auditores – somam ou subtraem ao processo de fusão?

Percebemos movimentos saudáveis visando readequação no perfil dos auditores as novas demandas de sua profissão, além de monitorar aspectos legais e de controladoria. Mas é notório que pelo perfil amalgamado em décadas, estes profissionais (e seus líderes) tendem ainda a trabalhar de forma reativa, extremamente legalista e com base em processos e indicadores de performance nem sempre razoáveis. Equivocam-se ao não se permitirem explicitamente observar as “sinalizações” do mercado, estas mais dinâmicas que as leis.

Este cenário é agravado por outros dois motivos. Um é que muitos auditores já tentam fazer um trabalho eficaz e proativo através de seus apontamentos de gestão temerária, mas se desmotivam por não verem atitudes pontuais e práticas por parte dos dirigentes envolvidos. Outro motivo é que, equivocadamente, ainda desfrutam de uma carreira alheia ao desenvolvimento e perpetuação do negócio, permitindo-lhes continuar apenas apontando as falhas dos outros e não se empenhando em ser parceiros nas implementações das soluções, mesmo que de forma discreta.

Esta mediana percepção e/ou interação comercial dos auditores e de seus líderes é vista claramente quando analisamos os cenários das incorporações. Na maioria das vezes, quando a auditoria detecta a crise através de sofríveis “indicadores” e/ou de fatos contábeis, percebe-se que não foram monitorados longos períodos dos aspectos comerciais e de gestão que antecederam a crise, nos quais, já havia claríssimos indicadores comerciais de algo nefasto.

A pergunta que devemos nos fazer é como se deve medir a eficácia da auditoria e de seus líderes, neste novo contexto mercadológico. Seria muito pouco apenas atender a requisitos legais e uma área reativa de controle interno. Os auditores devem gradativamente agregar competitividade a modelo de negócio das CC, sem desfocar dos aspectos legais. Lembremos que os auditores são “prestadores de serviços”, tal qual RH e TI, e são remunerados para agregar o máximo de valor a seus “clientes”, caso contrário, troca-se ou terceiriza-se.

Cabe aqui uma última e reflexão sobre a missão do auditor no modelo das CC. De forma equivocada, eventualmente, os maus dirigentes cooperativistas podem ser “beneficiados” pela falta de proatividade e interação comercial dos auditores quando do seu trabalho de campo. Há uma forte tendência de estes dirigentes acreditarem que sempre seu “filho” (CC) irá se safar de um cenário de baixíssima eficácia comercial ou de gestão. E só explicitarão sua necessidade de ajuda, quando o filho estiver na UTI, e se isto for constatado pela auditoria e/ou colocar seu patrimônio particular em risco.

Por mais que este cenário ainda permeie algumas singulares, centrais e confederações, ele deve ser coibido através de mudanças de atitude das autoridades competentes, em especial pela mudança do foco de seus auditores. Resumidamente. A missão atual dos auditores pouco ajuda neste novo cenário mercadológico, haja vista que uma instituição financeira vende, acima de tudo, CREDIBILIDADE EFICÁCIA na gestão do TODO.

Pistas ainda pouco analisadas para estudos de fusões e incorporações

É coerente admitir que a eventual “má” gestão comercial de uma Singular, seja “identificada” pela auditoria e desencadeie um projeto de “incorporação” ou “fusão”. Mas, imaginemos a seguinte hipótese. O problema não foi apenas de má gestão, mas sim uma ou a junção das seguintes falhas no projeto original, que:

Diante desta hipótese, cabem algumas reflexões oportunas visando entender as reais causas de algumas descompassadas fusões e incorporações:

Aqui pode estar mais uma hipótese que devem ser analisada pelo modelo cooperativista de crédito. Sabemos que há uma tendência dos projetos serem desenhados para atender aprovações, com isto se distanciando da realidade. Tornam-se projetos hiper otimistas, “super atrativos”, bem elaborados, com números interessantíssimos, com belos estudos, planilhas e gráficos, mas na prática se mostram pouco eficazes. O grave é que muitos deles são usados para balizar planejamentos estratégicos, donde surgem macro predileções mercadológicas intangíveis.

Conclusão

Encerramos este breve texto sem esgotar este extenso e delicado tema, mas acreditando que com estas reflexões você possa ter uma ainda maior amplitude dos tópicos afetos a seu negócio. Não concordar com elas, em parte ou no todo, é algo totalmente aceitável, haja vista que a intenção é apresentar distintos pontos de vistas para que o modelo cooperativista de crédito seja um sucesso não só no conceito, mas na prática, e que possa assim, desenvolver com maestria seus planos e objetivos sociais.

Estas percepções são frutos de quatro anos de estudos incessantes sobre o modelo CC e de inúmeros trabalhos realizados em grandes, médias e pequenas CC. Além, é claro, de três décadas de convivência direta com bancos de varejo massificados, financeiras, e instituições e empresas que exploram os correspondentes bancários e crédito consignado, além de participação ativa em seminários e congressos sobre o tema.

Estou a disposição para parcerias focadas na gestão, rentabilidade e aderência da base ao modelo cooperativista de crédito e na prospecção de novos associados rentáveis. Bem como em esforços de fusões e incorporações.

Concordar é secundário. Refletir é urgente.

Ricardo Coelho – Consultoria e Treinamento com Foco no Cooperativismo de Crédito

www.ricardocoelhoconsult.com.br – 41-3569-0466 – Postado em 18/04/2007