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Educação Financeira – Uma pizza de discórdias conceituais (Versão Completa)
Uma grande rede de pizzarias nacional crescia ano após ano, mas passou a viver uma grave crise comercial após inovar contratando um médico e nutricionista para melhorar o cardápio com foco na qualidade de vida. Esses profissionais de saúde tiveram espaço inclusive para opinar também no marketing da empresa. Passaram a retirar do cardápio as delícias calóricas, mesmo estas sendo o carro chefe de vendas. Colocaram com destaque uma advertência junto às propagandas e também no cardápio da pizzaria de que lá ainda havia pizzas muito calóricas que usavam ingredientes desaconselhados pela medicina. Algo parecido com as advertências dos enormes riscos nos maços de cigarro. Informaram também com destaque no cardápio que desaconselhavam as opções de refrigerantes e cervejas por não serem saudáveis, e aconselhavam a ingestão de sucos naturais.
Aparentemente, algo tão incoerente comercialmente que você pode estar pensando que isso foi uma loucura ou mesmo que isso não aconteceu. Mas, será? Vamos construir, doravante, com base em premissas, uma clara correlação dessa história com os esforços de Educação Financeira adotados internamente em algumas instituições financeiras próximas a nós.
Premissa 01 – O mercado define o cardápio, e não o bom senso
Sabe-se que o paladar é extremamente acentuado se o prato tiver gordura e sal (ou açúcar). Comer uma pizza é um ato social, mais do que unicamente sanar a fome. Assim, demora-se à mesa e bebemos normalmente refrigerantes e cervejas, que apesar de serem de enorme rentabilidade para a pizzaria, são sabidamente nada saudáveis. Ou seja, seria prudente retirar do cardápio de uma instituição financeira as soluções gordurosas como cheque especial, crédito parcelado, parcelamento do cartão de crédito e também retirar as bebidas – vendas adicionais –, como: seguros de baixa coerência, pacotes de serviços… mesmo sabemos que são essas as mais representativas receitas da instituição? Se retirarmos essas soluções dos “cardápios” entregues a nossos clientes mais glutões, estaríamos vivendo o mesmo estresse de sobrevivência da rede de pizzarias acima citada. Seria coerente?
Premissa 02 – O lucro do varejo está na dependência que gera venda adicional e cíclica
A rede de pizzarias cresceu focando satisfazer uma demanda natural de aglutinar pessoas frente a soluções de guloseimas bem temperadas e gordurosas, tendo assim cativos clientes que, mesmo sabendo que esta não era a alimentação mais saudável, iam espontaneamente se deliciar e ter momentos agradáveis socialmente com seus entes queridos. As instituições financeiras massificadas cresceram baseadas em elevados juros de linhas de crédito de consumo (não investimento). Linhas estas que mesmo tendo elevados riscos, têm-se avolumada, seja pela maior quantidade de clientes oriundos da classe remediada, seja pelos limites cada vez mais generosos e longos a eles alocados. E na carona destas linhas massificadas “rotativas e dinâmicas” é que se gera a enorme dependência financeira desses tomadores de créditos e as instituições cada vez mais atrelam soluções pouco eficazes para esses clientes, como o seguro de crédito, por exemplo, que na prática gera para a instituição uma boa e nova fonte de receita e uma maior garantia, mas encarece o crédito justamente para quem desejamos educar financeiramente.
Premissa 03 – A escolha é prerrogativa de qualquer mercado
Somos seres seletivos. Queremos escolher nossos governantes, nossos amigos, inclusive onde vamos comprar, mesmo diante de dezenas de concorrentes similares. Ao decidirmos, temos a sensação de que dispomos da prerrogativa da democracia de consumo. Se decidirmos de forma errônea, sabemos que podemos receber pênaltis financeiros e até sociais. Em última análise, a responsabilidade é do consumidor, mesmo que haja leis e normas que em princípio o defendem. Percebamos que a rede de pizzarias cresceu focando unicamente em satisfazer a uma demanda natural que é a de prover alimentação saborosa em ambiente harmonioso. Portanto, os usuários de soluções de instituições financeiras massificadas têm à sua disposição um enorme leque de opções, e ao decidirem por uma delas, julgam ser conhecedores das regras, dos benefícios e das responsabilidades dessa decisão.
Premissa 04 – A informação não determina o risco ou o mérito da decisão do cidadão
Tendo informação e opções, o cidadão mediano irá decidir sempre visando mais benefícios a si do que a seu parceiro comercial. Algo óbvio, mas que muitos tendem a esquecer julgando que apenas o parceiro comercial se beneficiará da transação. Se na pizzaria havia uma ótima estrutura esperando pelos seus clientes e se o cardápio continha os valores e detalhava as opções não há porque alegar que houve omissão de informação. Se o cliente ao pagar esta refeição passar um cheque sem fundos, o dono da pizzaria não poderá alegar falta de informação. Ou seja, a informação nunca será total em uma transação comercial, pois sempre haverá um lado que pode adotar subterfúgios que colocam a outra parte em risco, tal qual aconteceu com a renomada empresa Volkswagen, que fraudou os índices de emissão de poluentes de mais de 11 milhões de carros a diesel por mais de cinco anos, culminando na demissão do seu presidente, com uma perda enorme do valor de suas ações e dos veículos de sua marca, e enfurecendo os seus proprietários.
Percebamos que havia informações auditadas, mas mesmo assim as informações que pareciam inquestionáveis causaram uma enorme ruptura nos valores da empresa, inclusive na sua dita “ética”. Assim, podemos concluir que só informações e promessas não bastam para que sejam eliminadas as rupturas em uma transação comercial. Mesmo estando o cliente definido em relação à sua escolha ele será afetado pelos seus próprios vícios morais ou pelas prováveis intempéries econômicas ou ambientais onde está imerso. E o cliente ainda tem contra si as variáveis negativas que podem impactar seu parceiro comercial fornecedor da solução. Portanto, a mera qualidade e transparência da informação não é nada se não houver coerência funcional nas atitudes das partes.
Premissa 05 – Cultura não se muda por decreto
Vê-se que a dita nova classe média remediada nacional representa hoje o maior filão de ganhos das instituições financeiras de nosso varejo. Boa parte dela, naturalmente, não tem poupança por virem de classes menos favorecidas e, por isso, precisam do crédito para galgar novas conquistas sociais, sejam elas: escolaridade, habitação, melhoria de emprego, lazer etc. Além disso, essa classe é bombardeada por uma sociedade de consumo e, sendo assim, este público passa a usar o endividamento pessoal para tentar alavancar ou manter essas “conquistas”. Essa classe será facilmente influenciada pelos fornecedores de crédito massificado, pois, muito provavelmente, não dispõe de exemplos de cultura financeira na base familiar e social, somando-se a isso os péssimos exemplos de nossos governantes em escândalos nos gastos públicos. Diante disso, não poderíamos acreditar que a totalidade do crédito massificado seja benéfica aos seus tomadores, pois apesar de caríssimos, são por nós embalados como “fáceis”, com limites crescentes, retroalimentados etc.
Uma grande parte dessa população só tem acesso a soluções financeiras se recorrerem a instituições massificadas, reconhecidamente ricas por cobrarem deles taxas e tarifas muito acima daquilo que muitos consideram como razoável. Na prática, vê-se que nestas instituições não há orientação financeira pessoal, e se há, apesar de seu alto destaque de mídia, é de baixa eficácia.
As instituições financeiras massificadas sabem veladamente que, havendo opções parecidas no mercado, quanto mais esclarecida for esta clientela, menor será o lucro da instituição. Assim, essa enorme massa de clientes acessa de forma assoberbada soluções massificadas sem que tenha tempo e interesse para absorver os detalhes de forma razoável. Mas, a prática atesta que, diante da urgência de acessar o recurso sem se expor socialmente, mesmo que lhes déssemos todas as informações, eles manteriam a decisão tomada muito antes da explicação. Portanto, vejo com descrença as ações de aculturar esta enorme massa de clientes tomadores de crédito massificado sobre os riscos de continuar se endividando de forma desorientada.
Premissa 06 – Devemos defender a coerência e não o conceito
Se defendemos que nossa instituição faça Educação Financeira junto a seus clientes, deveríamos buscar coerência em nossas ações, pedindo a nosso empregador que elimine do seu cardápio suas linhas caras como o cheque especial, seus produtos de baixa coerência para o cliente e seus elevados pacotes de serviços os quais só são pagos pelos tomadores de crédito. Clientes estes que são os mesmos que desejamos educar financeiramente. Percebamos que é algo incoerente! E para agravar esta exposição de motivos quanto à baixa coerência do cotidiano frente aos esforços de Educação Financeira é muito provável que dos muitos de seus clientes que “deveriam” ser reciclados quanto a sua gestão creditícia, usam por mais de dois ou três meses o cheque especial sem cobri-lo.
Vamos, então, pensar nesta segunda: O que de prático fez a instituição? Sim, meses após meses, apenas cobrou deste cliente corretamente os elevados juros por ele devidos, e quem sabe, também tarifas e taxas elevadíssimas por estouro de conta. Isso justifica dizer que é pouco provável que uma instituição adote Educação Financeira para os seus clientes que podem ser recuperados crediticiamente. Caso contrário deveria se penitenciar sobre as centenas de outros clientes que ela ajudou a levar à crise financeira, tomando medidas para reparar este mal.
Por fim, se defendemos a Educação Financeira devemos questionar a coerência da instituição que nos emprega, pois muito provavelmente ela vem subindo suas taxas de juros do cheque especial, do seu crédito parcelado e do rotativo do cartão acima dos seus custos e da inflação, bem como elevando de forma robusta suas tarifas, pacotes de serviços etc.
E esse contexto agrava-se ainda mais, pois muito provavelmente nossa instituição definiu novas e agressivas metas para venda de soluções de baixa atratividade no Planejamento Comercial do ano, as quais só serão alcançadas se vendidas a clientes “desregrados” reconhecidos por serem insaciáveis compradores de crédito massificado. Percebamos que se desejamos manter a coerência dos esforços de Educação Financeira deve a equipe por ela responsável orientar estes compradores para não adquirir tais proibitivas soluções, pois isso fará mal para sua sobrevivência social.
Diante de tamanha agressividade comercial de uma instituição não é razoável alegar que toda esta “cesta de maldade” deve-se a reposição de custos e riscos. Pois sabe-se que esses são esforços na busca por maiores resultados, visando sua sobrevivência e competitividade. Ocorre que os gestores da instituição financeira sabem que mais de 90% dos resultados serão obtidos sobre aqueles a quem a sua instituição deseja propor a Educação Financeira. Algo que nos faz pensar sobre o que realmente desejamos com este esforço. Coerência e Efetividade ou Conceito e Mídia?
Lembrando que o outro grupo de clientes são os bons clientes investidores. Sabem de sua força frente à instituição, são hiper esclarecidos, querem cada vez mais ganhos e por serem raros são laçados no mercado. Tanto que não compram nossas soluções de baixa atratividade, pois não têm dependência financeira da instituição que escolheram. São eles que escolhem e “mandam”.
Premissa 07 – A prática questiona o objetivo
Pela realidade acima exposta, não será uma ação isolada de uma instituição financeira que irá fazer uma mudança relevante em hábitos tão internalizados nos eleitos para a Educação Financeira dos brasileiros ditos “desregrados” financeiramente, ainda mais diante da crise social que se avizinha e da agressividade crescente dos concorrentes. Sabemos que são enormes, caros e demorados os esforços em mudar a cultura de um cliente (não de sua família), e temos dúvidas se essa é missão de uma instituição financeira, a qual pode não ser inclusive a que este correntista concentra seus saudáveis negócios. Ou seja, assim estaremos ajudando um cliente que até então só fez os negócios mais arriscados conosco, presenteando o concorrente com seu “filé”. Ao educarmos financeiramente pode ser que ele passe a concentrar seus negócios na instituição que ele já usa e para a qual é rentável e saudável. E sobra o que para nós que o ajudamos?
Premissa 08 – Devedores querem discrição
É usual vermos ações massificadas visando aculturar quanto à Educação Financeira, sejam encartes, brochuras, palestras etc, as quais têm pouca eficácia quanto aos já ativos comercialmente ou aposentados. Mas, não nego que essas ações tendem a ter um mediano sucesso se forem feitas de forma lúdica junto aos jovens. Percebo pela experiência de mais de 40 anos neste mercado que o devedor “desregrado”, aquele que toma nossos caros créditos e paga nossas crescentes tarifas, deseja discrição acima de tudo. Portanto, ele não irá se expor em público indo a uma palestra, cujo título já é um atestado aos frequentadores de que eles têm pouca organização ou mesmo pouca responsabilidade social. Ele sabe que neste evento haverá um enorme grupo “desregrado” como ele, mas que não deseja estar ali para ser rotulado em público como uma pessoa que tem propensão a ter o nome sujo muito em breve.
Quem vive neste cenário acredita que sua crise não é tão severa e que em breve ele mesmo irá dar uma solução. Perceba que o grupo de Alcoólicos Anônimos de sua cidade tem razoável sucesso, pois com enorme discrição e sem alarido ele trata apenas daqueles que os procuraram de forma espontânea. O dependente sabe que lá há estrutura para realmente ajudá-lo em seu problema, sem exposição social e assim ele sabe que encontrou algo firme e personalizado e não algo solto, eclético, sem constância e sem acompanhamento pessoal. Por fim, prestemos atenção em quem frequenta suas AGOs, e observemos que os tomadores de crédito de consumo não comparecem. Por que será? Acreditamos que para ele não é um ambiente “feliz”. Seu ano foi sofrível. Estar com seus “semelhantes” não o ajudará. Comemorar o que?
Premissa 09 – Necessária coerência ao orientar nossos investidores
Vemos enormes esforços em orientar financeiramente os tomadores de crédito visando educá-los para que sejam prudentes ao se endividar. Mas como fica a outra parte de nossos clientes que conosco aplicam suas reservas financeiras? Estariam eles coerentemente atendidos por aqueles que defendem os esforços de Educação Financeira? A resposta tende a ser negativa. Senão, vejamos apenas duas breves observações para não nos alongar muito:
1ª. Algumas instituições com esforços em Educação Financeira tiveram enorme esforços em 2015 para captação de poupança junto a seus clientes, e mantém o mesmo esforço em 2016, inclusive fortalecendo a mídia e definindo fortes metas. Contudo, para o cliente em 2015 foi um péssimo negócio, pois o rendimento da poupança foi 8,15% a.a. frente a uma inflação oficial de 10,67% (IBGE). Ou seja, estes milhares de clientes perderam 2,52% a.a. do poder de compra de suas reservas. Onde estavam os esforços da equipe que promove a Educação Financeira desta instituição? Vejo que, buscando a sensatez da proposta da Educação Financeira e esquecendo as premissas comerciais, deveria a instituição então não oferecer mais poupança, pois ela tende a perder da inflação por mais alguns anos. E em seu lugar deveria oferecer uma solução como Depósito a Prazo, o qual, mesmo descontando o tributo, pagaria mais que a inflação.
Ou até mesmo, exagerando o exemplo, se a lógica da Educação Financeira é orientar o cliente quanto às suas melhores opções no mercado, e não limitada à instituição financeira do educador que lhe orienta, deveria este profissional, por exemplo, informar ao cliente que hoje a melhor opção para seus recursos conservadores é o Tesouro Direto. Aplicação tão segura quanto o Depósito a Prazo da instituição, fácil de fazer, e que lhe dará maior rendimento do que a aplicação disponível na instituição, na qual ele tem conta e que, por isso, indiretamente, paga o salário deste mesmo orientador financeiro. Vê-se que tende a ser incoerente comercialmente a aplicação racional e integral das premissas da Educação Financeira, salvo se esta for feita por palestrantes independentes, entidades do terceiro setor ou instituição públicas não bancárias.
Obs: sabemos da necessidade do direcionamento da poupança para esforços junto ao público rural, mas muito provavelmente a grande parcela dos clientes que aplicam na poupança não demanda tais recursos. Contudo, muitos dos que se beneficiam dos recursos oriundos de repasses subsidiados são clientes esclarecidos e optam por aplicar em Depósito a Prazo, em detrimento da poupança que o beneficia. Estes clientes que tomam recursos subsidiados podem inclusive aplicar suas reservas em outra instituição distinta daquela que lhe repassa os recursos subsidiados, lastreados pela poupança. Precisamos ser claros ao ponderar sobre esse emaranhado de interesses comerciais para que a equipe de Educação Financeira e seus defensores reflitam racionalmente frente a essas colocações.
2ª. Muitas Singulares não pagaram em 2015 a remuneração de até 100% da Selic ao Capital Social como determina a legislação, limitando-se a pagar percentuais menores, algumas vezes abaixo da poupança líquida ou ainda mesmo não o remunerando. Como já tratamos em vários artigos, as distribuições nas Sobras nada têm a ver com o Capital Social do sócio, portanto, a remuneração do Capital Social próxima do limite legal é uma demonstração de coerência e respeito ao sócio. Este Capital Social foi usado pela instituição para alavancar receitas que nas Sobras são distribuídas com relação aos negócios, podendo ser pífia aos maiores detentores de Capital. Assim, em algumas destas instituições que não remuneram o Capital Social ou o fazem em patamares que não corrigem de forma líquida nem pela poupança, fica complexo o discurso de Educação Financeira a um grupo de sócios ditos “desregrados”. Pois muitos deles que agora são assediados para a reeducação não tiveram dignamente remunerados seus capitais sociais pela mesma instituição que se rotula de exemplo e deseja o educar. O exemplo deve sempre partir de cima, pois é com ele que educamos nossos filhos.
Premissa 10 – Medir ou não a eficácia das ações de Educação Financeira
Claro que ações de Educação Financeira são vistas como louváveis, mesmo que eventualmente sejam usadas como ação de marketing para suavizar a fama agressiva que paira sobre as instituições financeiras massificadas. Contudo, em muitas instituições vemos que o discurso e a prática comercial são tão antagônicos aos esforços de Educação Financeira que nem parecem ser ações da mesma instituição. Uma parte da instituição age agressivamente sobre este público e, de outro lado, outra pequena parte pede sensatez por parte do cliente que faz uso desregrado das soluções creditícias massificadas, estas disponíveis e saborosas. Educação efetiva vem de berço e não de uma ou outra ação isolada. Aparentemente haverá ganhos, mas esse ganho é frágil no tempo, tanto que pouco se vê de métrica racional para validar o percentual de eficácia deste esforço consolidado no tempo, em especial a preocupação em saber quanto mais rentável e longínquo ficou o cliente que absorveu 100% da saudável cultura financeira que lhe orientamos. Para tanto, devemos distribuir os custos e o tempo total gasto com todos os assediados sobre os poucos que responderam assertivamente a nossos esforços de educação financeira, pois só assim teremos uma leitura racional da ação. A solução efetiva e edificante é muito mais complexa que palestras motivacionais, belas brochuras ou motes e logos empolgantes. Criança com fome não aprende.
Fica a pergunta: “A instituição adota medidas racionais para validar o resultado obtido com a Educação Financeira, ou divulga alguns pontuais resultados de sucesso como se todos que foram impactados pelo esforço tivessem respondido com esta dita “qualidade”?” Será que diante de uma crise de competitividade sua instituição manterá o espaço e os custos para desenvolver eficazmente a Educação Financeira ou a deixara inanimada?
Premissa 11 – Efeitos práticos da adoção da Educação Financeira
A decisão da instituição de prover Educação Financeira deve ser ponderada se esta desejar ter uma ação socialmente vista como ideal, assim contratando e dando espaço na gestão da instituição financeira para “médicos e nutricionistas” como fez a pizzaria no início deste artigo. Se for assim, teria que ter decidido explicitamente em seus últimos planejamentos estratégicos que iria procurar novas fontes de receitas, pois abriria mão das enormes receitas advindas dos seus clientes desregrados comercialmente, os quais atualmente compram 99% das suas soluções de baixa atratividade e são 100% dos que pagam seus pacotes de tarifas etc.
Se seguirmos a Educação Financeira, tomemos o cuidado de não sermos o diretor de marketing de uma empresa de cigarros ou cervejas, que apesar de serem obrigados a colocar advertências em suas embalagens e adotarem ações de sustentabilidade, fazem estripulias para vender cada vez mais seus perigosos produtos. Nosso produto crédito massificado tem a característica dos refrigerantes. Sabemos que fazem mal se consumido em excesso, mas ainda, por sorte, não somos obrigados a informar que seu uso exagerado é prejudicial à saúde.
Estamos diante de um enorme antagonismo de retórica. Se acreditarmos que são expressivos e efetivos nossos esforços de Educação Financeira, estamos contrários a toda e qualquer ação comercial adotada pela nossa instituição. Indiretamente, estaríamos nos comportarmos apenas como bons orientadores como são os funcionários públicos, os quais, em conceito, não precisam ser competitivos e, por não cogitarem a perda do emprego, não precisam ser efetivos na gestão dos recursos, não recebem metas para gerar receita crescente ao seu padrão etc. Então o que queremos? Ser efetivos ou ter uma ação estruturada para amortecer nossos críticos e ao mesmo apresentá-la como algo palatável na mídia como fruto da nossa gestão?
Premissa 12 – Inferência para uma eficaz Educação Financeira
Acreditamos que uma ação mais estruturada (e cara) pode surtir mais efeito sobre a base de endividados de sua instituição: contratar um orientador financeiro sênior que seja discreto, confiável e didático para atender em um local discreto e de forma individualizada, com horário marcado, os clientes que precisem mais rapidamente dessas orientações. Isso aconteceria mesmo que o quadro comercial da unidade tivesse condições de fazê-lo, pois isso os liberaria para novos negócios mais saudáveis. Esses clientes seriam convidados a levar seus extratos e a explicitar em 20 minutos a cada mês sua realidade a este orientador, o qual manteria segredo de suas conversar com os nossos clientes, visando à busca de uma retomada de boas condições comerciais e de crescimento para o cliente. Nesse assunto tão delicado, a falta de discrição será um mar de espuma, mas com baixíssima eficácia, mesmo que não queiramos acreditar. Toda ação nessa linha só terá efeito sobre o problema atual – base de clientes – se for um plano longo, caro, constante, discreto e principalmente se não for minada de conceitos e preceitos puritanos que pouco ou nada se alinham a realidade daqueles que vivem um enorme estresse financeiro.
Reflexão Final: ao clarificar a síntese do nosso ponto de vista perguntamos: “O que queremos verdadeiramente com nossos esforços de orientação financeira?” Parece-nos que a lógica racional da Educação Financeira não é a de aculturar o cidadão que só se endivide com juros baixos, mas, sim de educar para que o cidadão primeiro “poupe” para depois comprar a vista, sem nunca se endividar. Sensatez esta dificilmente vista nos esforços massificados de Educação Financeira.
Ressalvo aqui que fica fora desse contexto o endividamento inteligente com juros baixos, como crédito rural ou outros repasses, e, por enquanto, com ressalvas, o crédito imobiliário. Pois a aplicação desses recursos gera riquezas para autoliquidar o crédito e ainda dá ganhos ao cliente.
Realmente um artigo complexo em que não procuramos defender esta ou aquela premissa, mas, sim, apresentar e compartilhar argumentações de como vemos as inúmeras verdades frente a aparente grandeza da Educação Financeira, sobre a qual percebemos que, dependendo do prisma pelo qual é estudada, vê-se novas matizes de cores, por vezes escuras e opacas.
Concordar é secundário. Refletir é urgente.
Ricardo Coelho – Consultoria e Treinamento com Foco no Cooperativismo de Crédito
www.ricardocoelhoconsult.com.br – 41-3569-0466 – Postado em 13/01/2016