A taxa de juros pós-fixada em DI teria algo a confessar?  

Estamos em um cenário de estresse nunca vivido pelo nosso modelo de negócio e nos deparamos com questionamentos que poderiam ser considerados impertinentes há alguns anos. Um deles é o que coloca na berlinda a certeza que créditos mais longos deveriam ser concedidos com taxas mistas, uma parte fixa e a outra em DI (Depósito Interbancário), o qual segue a SELIC.

Mas algo está acontecendo, e que não foi observado na queda abrupta da SELIC em 2012, no Governo Dilma, quando essa taxa, de uma forma um tanto quanto política caiu, de 12,5%a.a. para 7,25%a.a. em pouco mais de um ano. Era outro cenário. O crédito crescia, o mercado interno estava aquecido, não havia desemprego, obtínhamos superávits comerciais e fiscais, as commodities tinham ainda mais mercado e preço, o dólar era favorável, vivíamos ansiosos pela Copa do Mundo e não tínhamos conhecimento das enormes corrupções que hoje nos aflige. Agora, vimos em menos de um ano a SELIC trilhar essa mesma queda, saindo de 14,25% a.a. para 7,5% a.a.. Contudo, hoje o nosso mercado está depauperado, o que nada lembra os bons ventos de 2012 e, para piorar ainda somos “feridos” pela corrupção, quebradeira de governos entre outras mazelas.

Então, fica o questionamento quanto à certeza inconteste que tínhamos de que, para melhor garantirmos nossos riscos frente a grandes oscilações do custo do dinheiro que emprestamos a médio e longo prazo, deveríamos adotar taxas de juros compostas por uma parte fixa e outra variável, e que essa fosse a mais fiel possível à oscilação do custo do dinheiro. Para tanto, adotou-se o DI como válvula, de tal sorte que passamos a ver como costumeiras as taxas de crédito acima de 24 meses definidas como “taxa fixa mais DI”, ou seja, um crédito em 36 parcelas passou a ter uma taxa fixa, por exemplo, de 0,7% a.m. mais a variação do DI.

Sem ponderar os entraves legais abordados em nosso recente artigo “As Imperfeições Jurídicas das taxas de juros atreladas ao DI” percebemos alguns vestígios de que essa certeza acima citada pode ter alguns calcanhares de Aquiles não observados em 2012, quando se viveu uma abrupta queda da SELIC. Será que temos respostas técnicas e claras sobre o que pode estar acontecendo com algumas carteiras de crédito com taxas atreladas ao DI, que de forma complexa teimam em apresentar redução em sua rentabilidade, perder saldo, melhorando, contudo sua adimplência?

Senão, vejamos um seguinte cenário. Um cliente que tivesse tomado crédito no início de dezembro de 2016 com taxa de juros fixa de 0,7% a.m. mais “1,2% a.m. de DI” (SELIC de 14,25% a.a.) imaginava que sua taxa seria 1,9% a.m. e uma parcela mensal de R$ 1.000,00. Passados 10 meses temos uma SELIC de 7,5% a.a. e para o cliente a parcela será de R$ 920,00 (ex.) já que sua taxa hoje seria de 1,3% a.m. (0,7% a.m. + “0,6%a.m. de DI”). Parece-nos que algo pode estar desalinhado, pois nosso custo do dinheiro e sua origem (funding) não tem uma relação direta com o DI como fica vitrificado na taxa de juros variável desse cliente. Nosso funding tem outras origens que custam muito menos que 100% do DI como pode ser o Capital Social, a média da remuneração do Depósito a Prazo, ou ainda não terem custo como Reserva, Depósito à Vista… . Donde se obtém o seguinte questionamento: Se meu cliente tem uma redução acintosa de valor na parcela pela queda do DI (SELIC), teria nosso modelo de negócio uma redução em percentual no seu custo do funding em mesma magnitude? Acreditamos que não. Nesse caso, o cliente teve uma queda de 0,6% a.m. (32%) de redução na taxa devida, mas certamente não foi essa a redução que tivemos no custo do funding. Tanto que é fácil encontrarmos carteiras de crédito definidas como “pós-fixadas” com redução relevante na sua rentabilidade e no saldo.

Vale aqui ressaltar que, de forma contrária, como descrito em nosso recente artigo “Selic baixa maquia o resultado no crédito”, vemos na quase totalidade das Singulares que adotam carteira fortemente alicerçadas em crédito pré-fixado, generosos ganhos premiados pela manutenção das taxas de juros, mesmo diante da redução do custo do funding (fruto da recente queda abrupta do DI), já que isso barateia muito seu Depósito a Prazo e a eventual remuneração do Capital Social.

Reflexão Final: quem sabe não estamos diante de um tema que deveria ser melhor compreendido e validado por nossos líderes? Há um sinal tênue de que existe um hiato entre a estratégia e a prática, o que pode colocar em xeque algumas de nossas certezas. Caso não haja equívocos, fica o aprendizado de rever nossas verdades diante de uma mudança drástica de cenário.

Concordar é secundário. Refletir é urgente

Ricardo Coelho – Consultoria e Treinamento com Foco no Cooperativismo de Crédito
www.ricardocoelhoconsult.com.br – 41-3569-0466 – Postado em 31/10/2017