Quais deveriam ser as reflexões legais sobre a fila por parte de nossos Executivos e Gestores Seniores? A resposta não é nada simples e pela carência de análises assertivas sobre fila, resolvemos compartilhar algumas de nossas percepções, sem querer apontá-las como verdadeiras ou esgotar o assunto. Devemos ter em mente que a fila é um antigo canal de entrega de soluções o qual ainda por vários anos fará parte de nosso cotidiano, bem como está se tornando cada vez mais cara e frágil comercialmente. Fila é um tema complexo e de risco, o qual requer uma gestão astuta e comercial. Vejamos abaixo nossas macros reflexões sobre fila, para os quais nossos líderes deveriam ter claro entendimento e posicionamento.

1º) Bancos de primeira linha: Precisamos entender como agem os bancos de varejo massificados quanto a fila para termos subsídios para nossas estratégias. Eles já atendem de forma distintas seus clientes Vips na fila, chegando, em muitos casos, a sinalizar esta distinção com filas específicas ou, de forma velada, dão prioridade máxima a eles no dispensador de senha. Também já se vê fila específica para atendimento de seus clientes empresariais. Diante de exemplos irrefutáveis devemos pensar se em breve não poderíamos adotar algo similar em nossas Singulares – Fila para sócios. Portanto, percebe-se que os bancos de varejo dão seu pior atendimento humano aos seus clientes de menor quilate e aos não correntistas. Estes “fracos” clientes ou usuários provavelmente irão se deparar com uma equipe junto aos caixas automáticos “barrando-os” na entrada à unidade, sinalizando que serão mais bem atendidos nos caixas automáticos ou internet banking, ou mesmo em um de seus parceiros correspondentes bancários localizados na proximidade daquela agência. Assim, comercialmente focam em dar um bom serviço a seus bons clientes sem elevar os custos da estrutura, além de dispersar a demanda por fila da agência para seu parceiro correspondente bancário. Lá irão ganhar um valor adicional líquido com este recebimento muito mais substancial que se fossem atendê-los em sua agência. Estas decisões unilaterais e estratégicas dos bancos são por eles defendidas com o apoio da Febraban e de um atuante departamento jurídico. Assim, atendem como exceção as demandas eventuais de alguma prefeitura, Procon ou Juizado local.

2º) Empenho político de nossos líderes: Há necessidade de um efetivo e metódico empenho dos nossos líderes de Singular e das nossas agências na busca de excelente relacionamento com os responsáveis pelas entidades reguladoras da fila nos municípios onde atuam. Nos patamares estaduais e federais esta missão é das entidades representativas como centrais, confederações… . Deste esforço, têm-se mais assertividade em repassar as regras operacionais de cada uma das unidades e agilidade nas ações diante das inevitáveis situações de estresse geradas pela fila.

3º) Singulares de nichos ou “de difícil acesso”: Temos Singulares com possibilidade de receber títulos compensáveis de não clientes mas não os desejam ver em suas filas já que focam apenas em seus nichos de clientes. Algo que é favorecido pois muitas destas Singulares têm unidades de atendimento em local de difícil acesso a população. Outro grupo de Singulares optou desde sua fundação por não atender não sócios, mesmo tendo agências voltadas para a rua, independente de ser ou não de livre admissão. Um último grupo de Singulares, por decisão unilateral, passou recentemente a não mais atender não sócios, sinalizando esta decisão na entrada de suas agências mencionando a Lei 5764/71 ou a LC 130/2009, onde estas “definem” que instituição foi constituída para atender unicamente seus sócios. Quanto a este último grupo, devemos ponderar que muitas delas são a única instituição financeira da cidade e devem estar atendendo toda a população.

4) Livre admissão: Este é um enorme diferencial nos ofertado pelo Banco Central, que indiretamente nos aproxima muito dos bancos de varejo quanto a amplitude do atendimento ao público. É relevante observar que é comum vermos em um mesmo mercado duas Singulares de livre admissão de uma mesma bandeira, com posicionamentos distintos quanto ao atendimento de não sócios em suas agências, fato que explicita a baixa coerência quanto ao entendimento do tema. Vale aqui ressaltar que muitas das Singulares que optaram por não atender não sócios em suas filas emitem títulos de cobrança compensáveis para seus clientes, contando que a grande maioria destes serão liquidados nas filas dos bancos concorrentes ou mesmo de outras Singulares. Contudo, não aceitam receber em suas filas os títulos emitidos pelos concorrentes, demonstrando que se beneficiam de uma situação comercialmente não ponderada. Já que é impossível imaginar que, por enquanto, os bancos possam se recusar a não receber em suas filas, caixas automáticos e internet banking títulos emitidos por estas Singulares eletivas. O que seria muito sério.

5) Convênio com concessionárias públicas: A grande maioria das Singulares formalizou convênios para recebimento das faturas das Concessionárias Públicas que atendem sua região, mas muito provavelmente estas Concessionárias adotaram contratos padrões, os quais foram feitos para atender originalmente suas parcerias com os bancos de varejo. O objetivo destes convênios para estas Concessionárias é obter o menor custo, baixa inadimplência e facilitar a vida da totalidade de seus usuários, pois têm como missão apenas benefícios sociais. Assim, estes contratos devem provavelmente não rezar que esta cobrança ficaria restrita aos sócios da Singular, e sim que será feito o atendimento a todos que comparecerem nas agências. Portanto, como em geral é muito menor a escala de sócios de uma Singular frente aos bancos, não imaginamos que estas grandes Concessionárias tivessem feito um contrato distinto para este convênio. Neste contexto e frente a governança, seria oportuno rever se estes e outros convênios firmados estão sendo cumpridos na íntegra, em especial pelas Singulares que não atendem não sócios na fila.

6º) Código de Defesa do consumidor: O relacionamento entre cliente e instituição financeira foi considerado pelo Supremo Tribunal Federal como um serviço que deve atender aos preceitos do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90). Embora nosso entendimento seja de que, em se tratando de atendimentos a sócios, donos e gestores do empreendimento cooperativo, a relação seja de natureza civil e estatutária não sujeita a essa legislação consumerista. Esse fator pode representar algum risco para as Singulares caso haja alguma provocação judicial deste assunto e seja abordada eventual obrigação de atendimento ao público em geral, devido aos convênios firmados com concessionárias considerarem as cooperativas de crédito como extensão direta da rede de atendimento das instituições financeiras. As quais, em conceito, devem suprir a necessidade da sociedade quanto ao pagamento de seus compromissos, independente se o cidadão é cliente do banco onde deseja liquidar o compromisso. A isto se acrescentam legislações protetoras do cliente de serviços bancários, especialmente quanto ao tempo de atendimento e prioridades para idosos, gestantes, pessoas com deficiência, que visam pressionar as redes de serviços bancários a prestarem um bom serviço à população quanto à fila, independente se estes mesmos legisladores prestam serviços públicos de igual qualidade exigida aos bancos, sobretudo em relação a qualidade e  tempo de atendimento.
Vale aqui ressaltar que as Singulares que optaram por não atender não sócios em sua fila e têm correspondente bancário se aproxima muito dos modus operandi dos bancos de varejo que visam obter receitas e/ou esvaziar sua fila na agência. Assim estas Singulares irão atender uma fila de não sócios no ambiente do seu cliente empresarial usando seu sistema tecnológico, além de obter receita extra originada por terceiros que, a princípio, deveria ser considerado um ato não cooperativo.

7º) LC 130/2009: Diante da nossa lei específica e convênios firmados com concessionárias de serviços públicos não podemos concluir, de antemão, se está correto ou não decidirmos por atender apenas nossos sócios em nossas filas, ou obter receita com não correntistas caso optemos por atendê-los. Vejamos que esta legislação reza no seu artigo primeiro que: As instituições financeiras constituídas sob a forma de cooperativas de crédito submetem-se a esta Lei Complementar, bem como à legislação do Sistema Financeiro Nacional – SFN e das sociedades cooperativas. E esta subordinação a leis maiores é reforçada em seu primeiro parágrafo: As competências legais do Conselho Monetário Nacional – CMN e do Banco Central do Brasil em relação às instituições financeiras aplicam-se às cooperativas de crédito. Já no seu artigo segundo em um primeiro momento limita a abrangência de operação aos sócios, mas em seu segundo parágrafo deixa facultativo o atendimento a não sócios. O artigo segundo diz: As cooperativas de crédito destinam-se, precipuamente, a prover, por meio da mutualidade, a prestação de serviços financeiros a seus associados, sendo-lhes assegurado o acesso aos instrumentos do mercado financeiro. E no seu segundo parágrafo está dito:Ressalvado o disposto no § 1o deste artigo, é permitida a prestação de outros serviços de natureza financeira e afins a associados e a não associados.

Apoio: Este artigo teve o apoio do Dr. Fábio Telles Siqueira, parceiro desta consultoria e renomado especialista em temas jurídicos do Cooperativismo de Crédito.

Reflexões finais: Nosso mercado exige que sejamos eficazes na intermediação da compra de recursos de bons aplicadores e da sua venda para saudáveis tomadores, agregando aos envolvidos produtos e serviços financeiros diferenciados. A fila é apenas mais um dos inúmeros canais de entrega de nossas soluções, e vem se mostrando o mais caro e ineficaz deles.

Este artigo segue a missão de nossa consultoria de compartilhar nossos pontos de vistas visando um futuro ainda mais pujante ao Cooperativismo de Crédito. Estas reflexões, somadas as do artigo: Fila e suas 1001 faces ocultas já postado em nosso site apresentam os intensos e complexos desdobramentos legais e comerciais a serem geridos pelos nossos gestores quanto a FILA.

Tendemos a considerar a FILA um mal cotidiano e necessário, o qual só recebe nossa atenção em situação de estresse, quando usualmente decidiremos e agiremos de forma pontual, assoberbada e ineficaz. Assim sendo, consideramos prudente nossos líderes se reunirem para analisarem detalhadamente a FILA, distintamente em cada uma de suas agências, e definirem a melhor estratégia para navegar sobre cada um de seus desdobramentos.

Concordar é secundário. Refletir é urgente.