2018 a 2022 – Será um voo de galinha?

Opinar sobre o cenário em que viveremos nos próximos cinco anos é relativamente fácil, ainda mais se essa nossa opinião não colocar em risco nossa liderança, empregabilidade ou patrimônio. Portanto, vemos muitos cenários otimistas sendo desenhados, mas esses não entregam seu emprego ou patrimônio como garantia de que seu palpite estará certo. Se errarem nas previsões, pouco arranhará sua credibilidade, pois sempre deixam sinalizada em suas ponderações uma válvula de escape dando-lhes o álibi para eventuais falhas em suas projeções (o mercado externo, o dólar, o clima etc.). É comum, então, vermos que a grande maioria deles, por ser mais vendedora, faz projeções otimistas pintando um quadro de molduras douradas com belas paisagens coloridas que sinalizam muitas atividades econômicas, como se fosse o florescer de uma luxuriante primavera.

Somos mais prudentes em nossas projeções para o Cooperativismo de Crédito. Vemos para os próximos cinco anos um cenário desenhado em um quadro com molduras mais tênues e com partes da pintura em matiz de cinza escuro e outras mais coloridas, demonstrando serem esses pontos de dinamismo. Cenário esse menos virtuoso e que nos parece ser o mais coerente com o nosso complexo e único mercado.

Nesse artigo vamos nos fitar no ano de 2018, pois ele terá a prerrogativa histórica de ser um marco na mudança de nossa economia, já que é o primeiro ano de retomada do crescimento depois do fim numérico de uma longa recessão. O tempo irá demonstrar se 2018 conseguirá essa façanha! Mas de qualquer forma precisamos refletir sobre ele, analisando se os seus já efetivos e inegociáveis sinais de estresses aqui descritos podem ter sido pouco ponderados em nossas otimistas projeções comerciais para os próximos anos.

a) O Brasil é único: o Brasil nos surpreende ano após ano ao destruir ou minar pontes de princípios macro econômicos que poderiam nos dar mais claridade sobre nosso futuro. Tanto que, nesse cenário de incertezas, boa parte de nossos detentores de “poupança” tendem a agir mais como investidores especulativos de curto e médio prazo do que focados em aportar suas reservas em projetos de grandes empresas ou na infraestrutura nacional. Assim, são os investidores externos que vêm fazendo esses investimentos de vulto e de longo prazo, como em grandes parques fabris ou de infraestrutura leiloada pelo governo. Então, para onde irão esses lucros e dividendos? Quem serão os donos da infraestrutura?

b) PIB sinaliza o que?: O PIB é apenas um macro indicador da riqueza produzida por uma nação, mas não é necessariamente algo que reflita a realidade dessa economia, ainda mais para nós que somos um país em desenvolvimento, com elevada informalidade e uma parcela ainda desconfortável quanto aos princípios da ética. Contudo, se analisarmos o PIB de forma mais coerente, partindo da premissa de que, como país em desenvolvimento, deveríamos estar crescendo a uma taxa média anual de 5%, o que não ocorre. Assim sendo, considerando apenas os últimos três PIB anuais, vê-se que tivemos um déficit de crescimento de 21,5% de PIB (-3,8%/2015, -3,6%/2016 e 1%/2017). Isso sinaliza que qualquer crescimento de PIB nos próximos anos será meramente para repor esse passado recente, e o mais desafiador é que deveríamos estar crescendo 5% a.a. mais um percentual do elevado déficit que acumulamos nesses últimos anos. Portanto, a análise purista do PIB nos leva a inferências nada coerentes, minando nossa liderança e nossa instituição.

c) Saída da Crise?: 2018 será o primeiro ano de uma propensa saída da mais desastrosa crise de nossa história. Isso significa dizer que os percentuais de crescimento a serem anunciados estarão sendo calculados por bases debilitadas de nossa economia, permitindo que facilmente tenhamos percentuais matematicamente expressivos, mas que tendem a ser apenas discretos sinalizadores de reposição de perdas.

d) Falta de norte do Governo: o governo deveria ter um programa estruturante de competitividade para liderar toda a economia, visando a um patamar muito mais desafiador. Como não tem esse norte, e muito menos credibilidade para propô-lo, teremos que esperar que a iniciativa privada e os investimentos externos façam esse trabalho. Ou seja, teremos ações pontuais de tradicionais segmentos e não um projeto de estruturação efetiva da economia nacional. Veremos ainda mais o fortalecimento do “cooperativismo” classista e dos lobbies focando em seus nichos mercantis que pouco empregam, pouco agregam valor à sociedade, ou que se mostram frágeis na distribuição de renda e na regionalização do desenvolvimento. Dessa forma, veremos mais ações políticas assistencialistas e populistas, gerando atraso no crescimento.

e) Eleições: teremos eleições em 2018, sendo o primeiro turno em 07/10 e o segundo em 27/10. Serão eleitos um novo presidente, governadores, deputados federais e estaduais, e 66% dos senadores. Como se vê pela mídia, já começaram os arranjos e o posicionamento explícito, visando a esses pleitos, inclusive com uma debandada maciça de ministros que sairão como candidatos. Isso, por si só, quase parará o Brasil, já que teremos um ano legislativo e judiciário focado nesse tema, em detrimento de coisas mais eficazes para a sociedade e a economia. A isso devemos somar que em dois anos teremos a combalida eleição municipal que também descarrilha as preocupações com o Brasil como nação, já que é no município que surgem os votos, que geram eleitos e, assim, apoio a cargos majoritários como os que ocorreram nesse ano de 2018.

f) Inflação Oficial: ela sempre será uma meia verdade. Uma hora estamos diante de uma grande oferta de alimentos e a inflação cai, outra hora é a falta de liquidez dos brasileiros endividados ou desempregados que não alimentam a inflação. Isso, quando não é a interferência do governo com objetivo político em algum item que direta ou indiretamente afeta a inflação oficial, já que o governo precisa que essa seja baixa para sua melhor avaliação junto à opinião pública. Essa intermediação pontual pode ser também focada na redução de suas despesas, como foi menor majoração do salário mínimo, que reduziu suas despesas com a aposentadoria, etc. Tanto que, ao analisarmos a inflação de 2,5% medida pelo IBGE de janeiro a novembro de 2017, veremos que ela é questionável, haja vista que nesse período ficou mais caro em 12,3% o plano de saúde, em mais 10,3% o ensino fundamental, em mais 7,8% a gasolina etc. Já caíram nesse mesmo período em 0,8% a carne acém, em 10% o arroz, em 42% o feijão carioca etc. Como se vê, precisamos ser críticos ao usarmos a inflação oficial como base para a gestão, além do que inflação baixa não é essencial para uma economia, como já visto na história recente de muitos países como foi o caso do Japão, por exemplo. Inflação zero e a década de 1990 de recessão. Precisamos de salário e renda para gerar consumo.

g) Desemprego: esse é outro agravante, e que tão logo não será minimizado pela flexibilização da Reforma Trabalhista. Dados oficiais dão conta de mais de 12 milhões de desempregados, e muitos comemoram mesmo a queda mínima desse volume. Esquecem de destacar que essa “recuperação” do emprego tem sinais depauperados como a forma de cálculo e qualidade do emprego, já que 75% das vagas “geradas” são informais, ou seja, empregos por conta própria e empregos sem carteira assinada. Isso sem computar o esquecimento daqueles que cansaram de procurar empregos e que orbitam sobre cidadãos que detêm renda. Além do que, os desempregados ou informais não recolhem impostos, mas usam diretamente a já debilitada máquina pública para suas necessidades de segurança, saúde etc. Isso gera um passivo social incalculável, o qual será debitado na sociedade formalizada.

h) Gastos perdulários do Governo: foi aprovado um déficit de 157 bilhões para o Governo Federal em 2018. Isso sinaliza que ele irá se financiar para cobrir esse rombo, e que pouco ou nada pode fazer para reduzir esse buraco, já que a maior parte de suas despesas fixas são salários e o custeio da máquina estatal, sobrando muito pouco para as ações para as quais seus ministérios foram constituídos. Ou seja, o investimento do governo no apoio a nação será próximo a zero. Além do que, já há estados e municípios que decretaram “falência” e vivem inanimados e em penúria ao ponto de fazerem a população civil socorrer algumas dessas entidades para que o mínimo dos serviços essenciais como saúde, segurança, educação etc., fiquem menos prejudicados. Veremos cada vez mais que nossos governos são, em grande parte, mamutes vegetativos. E essa realidade deverá estar cada vez mais no radar das despesas e estresses de nossos projetos de crescimento, pois, como já visto, para cobrir seus rombos, não irão rever sua gestão, e, sim, agravarão exponencialmente nossos impostos, como já o fizeram com o IOF que tínhamos como diferencial.

i) Educação: em 2017 tivemos a primeira queda no número de inscritos no Ensino Superior em mais de duas décadas. Metade dos brasileiros com mais de 25 anos não concluíram o Ensino Fundamental. 47% da população entre 14 e 20 anos abandonaram a escola. Em 12/2017 foi homologada a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) para a Educação Infantil e para o Ensino Fundamental (1º ao 9º ano). Uma evolução, mas para se buscar a equidade no aprendizado a nível nacional não basta somente a regulamentação, também é preciso a formação e contratação de bons professores, ótimas estruturas e segurança nas escolas. Ou seja, a educação, algo tão importante para o desenvolvimento de uma nação, está sucateada, e mais cedo ou mais tarde terá agravada sua letalidade social, pois o Brasil, mesmo com melhores índices na economia, não terá a devida produtividade e competitividade, potencializando um claro voo de galinha.

j) Feriados em 2018: teremos nove feriados nacionais e cinco pontos facultativos, sem considerar os feriados estaduais e municipais em função do aniversário das cidades ou outros, como decretar feriado no Dia da Consciência Negra. Só não haverá feriado nos meses de junho, julho e agosto, mas justo entre eles, de 14/06 a 15/07, teremos a Copa do Mundo de Futebol, entendida como sendo a paixão nacional. Sem aqui nos esquecermos em Outubro teremos as “desgastantes” eleições. Então, menos trabalho, mais custos e menos riqueza. Em função desses feriados, a Confederação Nacional do Comércio estima uma perda de receita de 22 bilhões. Imaginemos, então, a perda do setor industrial que é o mais representativo. Esse cenário aparentemente “feliz” pelos inúmeros feriados, em que em alguma monta é até favorável para o setor do turismo, não é suficiente para reverter o péssimo quadro em um momento em que o país precisa se recuperar de quedas sucessivas em sua economia e, urgentemente, melhorar sua arrecadação de impostos.

k) Ética falha: estamos tentando tirar um pouco do pó da corrupção que teima em ficar sobre nossa Constituição. Em vista disso, a população adotou a operação “Lava Jato” como mascote dessa luta, mas percebemos que a população está cada vez mais assustada com as traquinagens de políticos e até de alguns membros do judiciário para miná-la. A morosidade na definição e no cumprimento das penalizações de corruptos, em sua maioria líderes políticos e empresariais defendidos por caros advogados, dá a população uma sensação que para esses o crime compensa. Ou seja, nesse quesito ainda veremos muitas guerras para a construção de uma ética que possamos considerar como um diferencial de nossos líderes públicos ou privados. Já para os pequenos, a lei é muito mais impiedosa, lei essa que deveria ser o sinônimo de ética.

l) Endividados: o SPC Brasil informa que 60 milhões de brasileiros estão com o nome sujo, e destaca que metade dos brasileiros com idade entre 30 e 39 anos tem apontamento restritivo. Não há dúvidas que boa parte desses foi para o restritivo ao ser “seduzida” pelo fácil e longo financiamento, permitindo consumo desenfreado de bens não de primeira necessidade, mas que infelizmente foi surpreendida pela alta de desemprego. Sem renda não há consumo, e a economia para. Exportar, internalizando a renda de povos de outros países, é uma solução interessante para a balança de pagamentos e para o PIB, mas socialmente é algo fraco por ter efeitos apenas discretos para resolver os problemas estruturais e sociais do país.

m) Consumo de obviedades: diferente do que muitos possam ver, acreditamos que o consumo está muito mais contido depois da turbulência financeira recente vivida por uma grande parte dos brasileiros. Vejo que há uma demanda crescente por soluções não mais adiáveis, como: pneu gasto do carro; sapato gasto ou o pé da criança que cresceu nesses anos; conserto inadiável de uma parede trincada; etc. Ou seja, é muito mais “reposição” do que compra de algo novo. Esse movimento econômico certamente irá refletir nas finanças de outros agentes econômicos que na teia financeira são beneficiados, inclusive em uma menor inadimplência geral. Contudo, o volume de crédito teve nos últimos anos um crescimento muito abaixo da crítica, o que significa que os agentes financeiros estão ainda absorvendo os baques das provisões e perdas, e optaram por reduzir ou encurtar seus créditos, evitando sua exposição. Com um cenário melhor, irão gradualmente liberar suas regras, mas com custos acima do praticado no passado, o que reduz o crédito.

n) Ressurreição da marmita: um grande amigo comentou que seu cliente supermercadista estava eufórico com a venda de hortigranjeiros, frente à perda de venda de seus produtos mais elaborados e caros. A alegação é que seus clientes estão cada vez mais fazendo marmitas para levar ao serviço, não por serem mais saudáveis, mas, sim, para poupar recursos e seus vales refeições para poderem honrar crescentes despesas com: IPTU, IPVA, água, luz, telefonia celular, TV a cabo, internet, escola particular para os filhos, qualificação profissional etc. Portanto, perceba o crescimento da marmita em seu entorno e analise friamente se ela não é um discreto sinal que a crise é mais profunda do que muitos querem acreditar.

o) Ótima equipe econômica: este aspecto é destacado. Há muito tempo não tínhamos uma equipe econômica de tal quilate. Assim, apesar de usarem muito bem as soluções da macroeconomia, são constantemente minados pelos desmandos dos entes públicos, com destaque aos governos federais e estaduais. Eles, muito embora perseverantes, tendem a ter gradualmente seu trabalho minado por sucessivos impactos do governo, e isso, como tudo na vida, tem um limite. Devemos crer que, mantendo as atravessadas políticas com efeito econômico (liberação para salvamento de governos quebrados, fraca e ainda incerta reforma da previdência, REFIS em cima de REFIS, etc.) muito em breve esse elástico irá estourar na direção da equipe econômica. Equipe essa que merecidamente empresta sua credibilidade e confiança aos empreendedores nacionais e internacionais, os quais por necessidade funcional deixaram de dar atenção aos recorrentes desmandos desse inapto governo e resolveram voltar a trabalhar, dando vida à roda da economia.

Reflexões finais: Nossos líderes Cooperativistas de Crédito têm nesse artigo reflexões para amalgamar suas convicções e melhor alinhar suas Singulares a nosso estressante mercado. Otimismo exagerado faz com que gastemos muito tempo criando cenários fantásticos e, assim, baixemos nossa guarda, permitindo que o Sr. Mercado nos nocauteie. Para que nosso crescimento dentro de cinco anos seja perene precisamos fazer primeiro nossa lição de casa quanto a competitividade de nossas instituições e esperar que o Brasil, com destaque a sua classe política e judiciária, tenha internalizado os grandes pilares da ética e do crescimento.

Devemos observar que para o PIB efetivamente parar de cair irá requerer um enorme dispêndio de energia de nossa econômica, e não apenas um ano com um acréscimo de 1% como o de 2017 frente à queda de 3,6% em 2016. Percentualmente são alvissareiros os 4,6% de recuperação em um ano, mas ainda não nos convence, pois tudo leva a crer que estamos de fato no final da curva de queda, iniciando uma curva complexa que é a de manter por anos um patamar que não mais espelhe perda, e assim, termos um sinal de futura recuperação.

Os anos de 2018 a 2022 serão esse período em que poderemos ver a sinalização efetiva de que paramos de cair e que há condições a frente de crescimento estruturado e gradual para o Brasil. Portanto, ser altruísta não nos ajudará em nada frente a esse agressivo cenário, ditado por um mercado estressante, e “liderado” por agentes federados inaptos, caros e perdulários, que teimam em furar a bola quando o jogo começa a ficar bom para os empreendedores e para a população. Vemos 2018 a 2022 como os voos de galinha: desajeitados e rasantes.

Concordar é secundário. Refletir é urgente.

Ricardo Coelho – Consultoria e Treinamento com Foco no Cooperativismo de Crédito
www.ricardocoelhoconsult.com.br – 41-3569-0466 – Postado em 08/01/2018